“Oculta” (Nocturna #2)
Maya Motayne
Tradução: Flávia Souto Maior
Seguinte – 2022 – 448 páginas
No segundo volume desta trilogia fantástica, Alfie e Finn terão de unir forças mais uma vez para firmar uma aliança de paz com um reino inimigo ― e impedir que um grupo rebelde se estabeleça em Castallan.
Depois de trabalharem juntos para salvar o reino de Castallan de uma magia maligna, os caminhos de Alfie e Finn tomam rumos diferentes e eles ficam meses sem notícias um do outro. Enquanto Alfie se prepara para assumir a coroa como rei e cuida de uma importante aliança política para o reino, Finn parte numa viagem, aproveitando a liberdade recém-adquirida de Ignacio, o homem que a controlou de forma cruel durante anos.
O problema é que Alfie enfrenta desafios diante das questões políticas do reino, principalmente com Iglésia, um reino rival que escravizou Castallan por anos e continua escravizando o próprio povo. Mesmo tentando fugir do passado, Finn se vê de volta a Castallan, só que dessa vez muito mais poderosa: de uma simples ladra, ela se torna uma das senhoras do crime da cidade. Em meio a ataques violentos de assassinos mascarados, o destino volta a unir Alfie e Finn, que precisarão trabalhar juntos para evitar uma guerra, enquanto lidam com os próprios fantasmas.
O mundo não é um lugar justo, todos nós sabemos disso. O universo bookstan não poderia ser diferente, e essa é a única explicação que eu posso pensar para “Nocturna” não estar fazendo todo sucesso do mundo no Brasil a ponto de falarem sem parar sobre estes personagens (e você pode ler minha resenha sem spoilers clicando AQUI). “Oculta” chega ao Brasil pela Seguinte na versão on demand – ou seja, você compra e o livro é impresso para ser vendido, sem estoque, e isso me deixou com o coração sangrando de dor porque “Nocturna” é um livro tão, mas tão bom, com inversão de papéis de mocinha e mocinho, magia inspirada na cultura latina, representatividade e todos ingredientes que pode fazer uma fantasia ser maravilhosa deliciosa.
O 1º livro foi uma aposta editorial, tanto que pode ser tido como um livro com trama fechada – quando a trama termina, você sente que a história contada pela autora Maya Motayne poderia se encerrar ali de tão redondinha que ficou. Claro que quando o livro vendeu bem lá fora, a editora deu sinal verde para as continuações, e assim “Oculta” chegou ao mercado mais de um ano depois do lançamento do 1º livro, atrasado por causa da pandemia (respectivamente nos anos 2019 e 2021). Um terceiro livro é esperado com título de “Lucero” com publicação esperada para o ano de 2023, mas não encontrei confirmação em nenhum lugar fora o Goodreads. A própria Maya não é lá muito presente nas redes sociais e não postada nada em seu feed do IG desde Abril de 2021, então esse é compilado de informações sobre uma trilogia que eu amo e acho que você deveria ler. Mas agora vamos falar especificamente sobre “Oculta”, um 2º livro que joga a barra de qualidade da série lá pra cima e claro que vou precisar comentar algumas coisas do livro 1, mas vou evitar ao máximo dar qualquer spoiler. Então vamos lá!
Finn olhou nos olhos dele e percebeu uma coisa. A magia podia ser falada e desenhada com giz, ou invocada ao se controlar um elemento, mas ali havia outro tipo de magia. O tipo que nasce quando a confiança floresce entre duas pessoas, uma confiança capaz de sobreviver aos piores defeitos e segredos, aos maiores medos.
“Oculta” começa 4 meses depois do final de “Nocturna”. Meses nos quais Alfie continua tentando ser o melhor principe herdeiro possível para Castallan, tentando seguir os passos de seu irmão Dezmin e continuar a Cúpula da Paz, um encontro com o toda a família real da Inglesia para tentar acordar e selar a paz de vez entre os reinos. Claro que nem todos moradores de Castallan estão aceitando isso depois de todo passado entre os dois países, tão bem explorado em “Nocturna”. A revolução (vamos chamar assim), começa a crescer mais e mais, mesmo com as melhores intenções de Alfie e seu pai, o Rei Bolívar – e ainda da Rainha Amada e do primo de Alfie, Luka, que neste segundo livro está mais maravilhoso e com participação maior ainda também depois de tudo que aconteceu com ele e como foi salvo. (Note que eu estou tentando arduamente não dar qualquer spoiler aqui!)
Em contrapartida, temos Finn em sua aventura tão desejada: agora uma pirata mais a vontade em sua própria pele e usando mais seu rosto, o que deixa meu coração quentinho porque ela é a personificação latina, desde a descrição da cor da sua pele marrom, lábios volumosos até o mar de cabelos cacheados. Finn continua a mesma personagem badass que já conhecemos: sabendo lutar, fingir, enganar, mentir, roubar e amar como poucas personagens atuais. Eu fico realmente triste desta rainha não estar sendo clamada como deveria ser, com sua inteligência latente e suas tiradas sagazes. Voltando a trama, tudo parece estar indo muito bem para a personagem a não ser pela saudade que ela sente de Castallan e de um certo príncipe (calma que vou mencionar o romance em breve). Entretanto, um certo roubo que ela sofre a leva ter certeza de que precisa rever Alfie, e é assim, lá pelo quarto inicial do livro, que as narrativas dos personagens voltam a se encontrar bem do jeitinho dos dois e que o leitor já se acostumou: no susto, para nosso deleite.
— Ouça, muchacha, não posso dizer se o que a vidente te mostrou é real. Videntes podem se enganar. O que posso fazer é dizer o que minha abuela falaria se estivesse aqui.
— O quê? — Finn perguntou, irritada pela esperança na voz.
— Ela falaria para você aceitar seu destino tal como ele é. Sem lutar contra. Mas minha abuela era tradicional, e eu sou bem diferente dela. Então também vou te dizer uma coisa: se você acha que o futuro que viu é resultado de seus destinos estarem interligados, talvez possa criar um novo destino. Modificá-lo.
— Qué?
— O futuro é fluido como água, não é gravado em pedra. Se você acha que ficar perto dele vai provocar algum mal, desembarace seus destinos. Afaste-se, e talvez isso faça nascer um novo destino para ele. Um futuro em que não seja ferido. Não há garantias, não há promessas de que vai funcionar, mas já é alguma coisa.
Mas o passado parece que não deixou Finn de lado e ela começa a ser atormentada de uma forma realística demais por pessoas do seu passado (sem spoilers, sem spoilers!!!). Para complicar mais ainda, depois da morte de Kol, que era a rainha do crime de Castallan, a próxima na linha de sucessão é… Finn. Claro que ela vai se meter nessa e vai se enrolar muito mais do que já está em toda trama que a levou ao país novamente, só que agora como líder dos ladrões da cidade que podem ou não ter participação na revolução dos cidadãos contra Alfie e sua família, e tudo isso acontecendo enquanto a família real Inglésia chega: o Rei Alistair e a Rainha Elinore com seus filhos gêmeos, o príncipe Marsden e a princesa Vesper.
Tudo que Alfie mais deseja é selar a paz e manter seu povo a salvo, e é aqui que temos uma inversão nesse livro que eu particularmente amo: estamos acostumados a ver mocinhas que detêm algum poder, mas elas são o coração do relacionamento, aquela que deseja salvar as pessoas e que mantêm o mocinho sempre dentro do esperado e algumas vezes se torna a bússola moral do personagem masculino principal, enquanto aqui temos o contrário: Finn é a personagem que desconfia de tudo e todos e sabe o que quer, que está disposta a conseguir o que quer e não tem o menor problema de julgar e dar o que as pessoas que a ferem merecem, enquanto Alfie é o sonhador, o bom rapaz, o que quer salvar os outros, o crédulo (que beira a ingenuidade). Essa inversão é magnifica e guia o relacionamento deles, transformando as cenas dos dois sempre em momentos maravilhosos porque é um romance que tem muitos mais chances de dar errado do que certo. Eu falei romance?
— Não acho que exista um bom motivo para eles terem morrido e você ter sobrevivido, mas acho que você pode fazer alguma coisa com sua vida, enquanto ainda está vivo. E acho que essa coisa não é lutar.
Luka respirou fundo, sentindo um estranho alívio tomar conta de seu corpo.
Os dois se olharam, e Luka ficou imaginando se existiria algo, além da morte, pelo que viver.
Sim, enquanto em “Nocturna” mal temos qualquer romance (apesar do sentimento e química claramente estar lá), aqui em “Oculta” a coisa realmente anda e o relacionamento de Alfie e Finn progride, muito pelos meses que passaram separados. Sem se darem conta, os dois sempre se procuram e sempre se salvam, até que não resta mais saída além de admitirem o que sentem um pelo outro. Confesso que fiquei surpresa com a progressão do romance, principalmente quando você compara com o livro 1, mas não me incomodei porque a química dos personagens realmente funciona e mesmo com um grande perigo em torno deles, eu queria ver Finn salvando Alfie mais uma vez para jogar na cara dele que ele não poderia ser tão bom assim – que é o meu problema com esse livro.
Claro que existe toda uma trama acontecendo e o perigo vai escalando mais e mais, mas Alfie foi realmente muito ingênuo sobre o que estava acontecendo ao redor dele. Agora ele está mais maduro, mas, ainda assim, sua vontade de salvar todos pode levar justamente ao oposto, já como ele está dando espaço para tramarem tão perto dele a ponto de colocar em risco a vida das pessoas que ele mais ama, e até mesmo Luka, que é bem mais esperto e ativo para a vida, pareceu se deixar levar pelo que sentia e não prestou atenção nos sinais perto deles, mas acho que qualquer leitor mais atento vai sacar da onde diversos ataques estão vindo. A ideia vilanesca da vez é realmente muito boa, mas obviamente não vou contar: só vou dizer que envolve magia de um jeito muito criativo que me encanta, já como a mitologia latina está mais presente do que nunca no livro.
— Eu sei. É exatamente por esse motivo que devo fazer isso. Sou o futuro rei de Castallan. Sou um produto das lutas e vitórias de meus ancestrais. — Ele pegou nas mãos da mãe e do pai. — Sou produto de pais maravilhosos que me criaram para saber que meu papel vem com poder e privilégio, e que devo usá-los para o bem. Não posso ficar parado e deixar a Inglésia prejudicar outras pessoas como fez com nosso povo, e não vou permitir que uma guerra tire um único soldado castallano de nós. Não se eu puder evitar. Nasci para me sacrificar por um bem maior. Devo fazer isso.
Lágrimas escorriam pelo rosto da mãe dele. Sem dizer uma palavra, a rainha o puxou para um forte abraço. Quando Bolívar se juntou a eles, apertando-o com força, Alfie soube que seu destino estava selado.
A outra única critica que tenho sobre “Oculta” é sobre como muitas vezes a trama pareceu não caminhar: Finn sendo cabeça dura e Alfie querendo salvar todos estavam em um círculo vicioso por páginas demais. Talvez meu problema seja porque eu sou descrente demais e saiba muito bem que não podemos salvar todos, então eu sempre estava do lado de Finn – mas a teimosia dela também me deixou exasperada, do jeitinho que uma personagem maravilhosa do quilate dela merecia.
Vou ficando por aqui mais uma vez repetindo que não entendo como esses livros não estão sendo hypados como merecem porque eles tem tudo que os bookstans amam: trama bem amarrada, vilões com motivações bem fundamentadas, universo latino, palavras em espanhol, representatividade, personagem não branca no centro. Seja como for, eu vou torcer muito para “Oculta” sair das sombras e se tornar bem mais conhecido porque o livro merece. E os Bookstans também.
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