Cena da Estufa no ponto de vista do Jace

Esta é uma cena extra, a famosa cena da estufa de Cidade dos Ossos (Capítulo 17 – A Flor da Meia-noite), onde acontece o primeiro beijo de Clary e Jace, mas pelo ponto de vista do Jace. Postado por Cassandra Clare em janeiro de 2012, em seu Tumblr, pela vitória de Clary no Torneio Heroína YA.

Quando chega a meia-noite

Eu beijei seus lábios e parti seu coração

O sino do Instituto começa a badalar, a profunda e alta batida do coração do ápice da noite.

Jace abaixa sua faca. É um pequeno canivete elegante, com cabo de osso, que Alec lhe deu quando se tornaram parabatai. Ele o usava constantemente, e o punho amaciou com a pressão de seus dedos.

“Meia-noite”, diz ele. Ele pode sentir Clary ao seu lado, sentada entre os restos de seu piquenique, sua respiração suave no ar fresco e com cheiro de folhas da estufa. Ele olha não para ela, mas para frente, para os botões fechados e brilhantes da planta medianox. Ele não sabe ao certo por que não quer olhar para ela. Ele se lembra da primeira vez que viu a flor desabrochar, durante a aula de horticultura, sentado num banco de pedra com Alec e Izzy de cada lado dele, e os dedos de Hodge na haste da flor ele os acordara próximo à meia-noite para mostrar a eles a maravilha, uma planta que normalmente crescia apenas em Idris e lembrou-se de ter prendido a respiração no ar invernal da meia-noite, ao ver algo tão surpreendente e belo.

Alec e Isabelle ficaram interessados, mas não, ele se lembra, tomados pela beleza daquilo como ele. Ele estava preocupado mesmo agora, enquanto os sinos tocavam, que Clary ficaria do mesmo jeito: interessada ou mesmo satisfeita, mas não encantada. Ele queria que ela sentisse como ele se sentia em relação à medianox, embora não soubesse por quê.

Um som escapa de seus lábios, um leve “Oh!”. A flor está desabrochando: abrindo-se como o nascimento de uma estrela, toda pólen cintilante e pétalas de ouro branco. “Elas florescem todas as noites?”

Uma onda de alívio passa por ele. Seus olhos verdes estão brilhando, fixos na flor. Ela está flexionando os dedos inconscientemente, do jeito que ele passou a entender que ela faz quando deseja ter uma caneta ou lápis para capturar a imagem de algo à sua frente. Às vezes, ele deseja poder ver como ela: ver o mundo como uma tela a ser capturada em tinta, giz e aquarela. Às vezes, quando ela olha para ele daquela maneira, ele se encontra quase corando; uma sensação tão estranha que ele quase não a reconhece. Jace Wayland não fica vermelho.

“Feliz aniversário, Clarissa Fray”, diz ele, e a boca dela se curva em um sorriso. “Tenho algo para você”. Ele se atrapalha um pouco, colocando a mão no bolso, embora ache que ela não percebe.

Quando ele pressiona a pedra de luz enfeitiçada em sua mão, ele está consciente do quão pequenos os dedos dela são sob os dele delicados, porém fortes, calejados de horas segurando lápis e pincéis. Os calos fazem cócegas na ponta de seus dedos. Ele se pergunta se o contato com sua pele  acelera o pulso dela do mesmo jeito que o dele acelera quando ele a toca.

Aparentemente não, porque ela se afasta dele, sua expressão revelando apenas curiosidade. “Sabe, quando a maioria das garotas diz que quer uma pedra grande, elas não querem dizer literalmente uma pedra grande.”

Ele sorri sem querer. O que é incomum por si só; geralmente apenas Alec ou Isabelle conseguem arrancar risos dele. Ele soube que Clary era corajosa na primeira vez que a encontrou entrar naquela sala após Isabelle, desarmada e despreparada, requer o tipo de coragem que ele não associava com mundanos mas o fato de que ela o fazia sorrir ainda o surpreendia.

“Muito engraçado, minha sarcástica amiga. Não é uma pedra, exatamente. Todos os Caçadores de Sombras tem uma pedra de luz enfeitiçada. Ela te trará luz até mesmo entre as sombras mais escuras deste e de outros mundos.” Eram as mesmas palavras que seu pai havia lhe dito, quando ele ganhou sua primeira pedra. Que outros mundos? Jace perguntou, e seu pai apenas riu. Há mais mundos a um sopro de distância deste do que grãos de areia em uma praia.

Ela sorri para ele e faz uma piada sobre presentes de aniversário, mas ele sente que ela está emocionada; ela desliza a pedra para seu bolso cuidadosamente. A flor já está derramando pétalas como uma chuva de estrelas, iluminando o rosto dela suavemente.

“Quando eu tinha 12 anos, eu queria uma tatuagem”, diz ela. Uma mecha de cabelos ruivos cai sobre seus olhos; Jace tem que resistir contra o desejo de estender a mão e colocá-la no lugar.

“A maioria dos Caçadores de Sombras obtém suas primeiras Marcas aos 12 anos. Devia estar no seu sangue.”

“Talvez. Embora eu duvide que a maioria dos Caçadores de Sombras faça uma tatuagem do Donatello das Tartarugas Ninja em seu ombro esquerdo.” Ela está sorrindo, daquele jeito que sorri quando diz coisas que são totalmente incompreensíveis para ele, como se estivesse se lembrando com ternura. Isso envia uma pontada de ciúmes através das veias dele, embora ele não tenha certeza do que está com ciúmes. De Simon, que entende as referências dela a um mundo mundano do qual Jace jamais fará parte? O próprio mundo mundano ao qual ela poderia um dia retornar, deixando Jace e seu universo de demônios e caçadores, cicatrizes e batalhas, agradecidamente para trás?

Ele limpa a garganta. “Você queria uma tartaruga no seu ombro?”

Ela acena com a cabeça, e seu cabelo volta para o lugar. “Eu queria cobrir minha cicatriz de catapora”. Ela puxa a alça de sua blusa para o lado. “Vê?”

E ele vê: há uma espécie de marca no ombro dela, uma cicatriz, mas ele vê mais do que isso: a curva de sua clavícula, as sardas em sua pele como uma leve camada de ouro, a curva aveludada de seu ombro, o pulso na base da garganta. Ele vê o contorno de sua boca, seus lábios levemente abertos. Seus cílios acobreados quando ela os abaixa. E ele é tomado por uma onda de desejo, do tipo que ele nunca experimentou antes. Ele obviamente já havia desejado garotas antes e sempre satisfez esse desejo: ele sempre havia pensado nisso como uma fome, uma necessidade por uma espécie de combustível que o corpo queria.

Ele nunca havia sentido um desejo como este, um fogo puro que queimava seu pensamento, que fazia suas mãos não tremerem exatamente, mas vibrarem com energia nervosa. Ele desvia os olhos dela, apressadamente. “Está ficando tarde”, diz ele. “Deveríamos voltar lá para baixo.”

Ela olha para ele com curiosidade, e ele não consegue evitar a sensação de que aqueles olhos verdes podem ver através dele. “Você e Isabelle já namoraram?”, pergunta ela.

Seu coração ainda está batendo forte. Ele não entende a pergunta. “Isabelle?”, ele repete. Isabelle? O que Isabelle tem a ver com alguma coisa?

“Simon estava se perguntando”, diz ela, e ele odeia o jeito como ela fala o nome de Simon. Ele nunca havia sentido nada assim antes: nada que o enervasse como ela fazia. Ele se lembra de ter ido até ela naquele beco atrás da cafeteria, do jeito que ele queria levá-la para fora, para longe do garoto de cabelos escuros com quem ela sempre estava, para o seu mundo de sombras. Ele sentiu, mesmo então, que ela pertencia ao lugar que ele pertencia, não ao mundo mundano onde as pessoas não eram reais, onde elas passavam um pouco além de sua visão como fantoches em um palco. Mas essa garota, com seus olhos verdes que o prendiam como uma borboleta, ela era real. Como uma voz em um sonho, que você sabe que vem do mundo desperto, ela era real, perfurando a distância que ele estabelecera tão cuidadosamente sobre si como uma armadura.

“A resposta é não. Quero dizer, pode até ter havido um momento em que um de nós considerou isso, mas ela é quase uma irmã para mim. Seria estranho.”

“Você quer dizer que Isabelle e você nunca

“Nunca.”

“Ela me odeia”, diz Clary.

Apesar de tudo, Jace quase ri; assim como um irmão, ele tem um certo prazer em observar Izzy quando ela está frustrada. “Você apenas a deixa nervosa, porque ela sempre foi a única garota entre uma multidão de garotos que a adoram, e agora ela não é mais.”

“Mas ela é tão linda.”

“Você também.”
Jace diz automaticamente, e vê a expressão de Clary mudar. Ele não consegue ler seu rosto. Não como se ele nunca tivesse dito a uma garota que ela era linda antes, mas ele não conseguia se lembrar de uma vez que não tivesse sido calculado. Que tivesse sido acidental. Isso fez com que sentisse vontade de ir à sala de treinamento e atirar facas, chutar, socar e lutar com sombras até que ele estivesse sangrando e exausto e, se sua pele ficasse esfolada, era apenas o jeito ao qual estava acostumado.

Ela olha para ele, em silêncio. A sala de treinamento, então.

“Nós provavelmente deveríamos descer”, ele repete.

“Tudo bem.” Ele também não consegue dizer o que ela está pensando através de sua voz; sua habilidade de ler as pessoas parece tê-lo abandonado e ele não entende a razão. A luz da lua desce através dos painéis de vidro enquanto eles fazem seu caminho para fora, Clary ligeiramente na frente dele.

Algo se move à frente deles uma faísca de luz branca e de repente ela para e dá meia-volta em direção a ele, já dentro de seus braços, e ela é quente, macia e delicada e ele a está beijando.

E ele está atônito. Ele não funciona assim; seu corpo não faz coisas sem sua permissão. É seu instrumento tanto quanto o piano, e ele sempre esteve perfeitamente no comando. Mas ela tem um gosto doce, como maçã e cobre, e seu corpo em seus braços está tremendo. Ela é tão pequena; seus braços a envolvem, para firmá-la, e ele está perdido. Ele entende agora por que nos filmes, os beijos são filmados daquele jeito, com a câmera girando sem parar: o chão é instável sob seus pés e ele se agarra a ela, pequena como ela é, como se ela pudesse segurá-lo.

Suas palmas acariciam as costas dela. Ele pode senti-la respirando contra si; um suspiro entre beijos. Os dedos finos dela estão em seu cabelo, em sua nuca, se enrolando suavemente, e ele se lembra da flor medianox e da primeira vez que a viu e pensou: aqui está algo lindo demais para pertencer a este mundo.

Ele ouve o sopro do vento primeiro, devido ao seu treinamento. Ele se afasta de Clary e vê Hugo, empoleirado na curva de um cipreste anão próximo. Seus braços ainda estão ao redor de Clary, seu peso leve contra ele. Os olhos dela estão semicerrados “Não entre em pânico, mas temos plateia”, ele sussurra para ela. “Se Hugo está aqui, Hodge não estará muito longe. Temos que ir”

Seus olhos verdes tremulam totalmente abertos, e ela parece divertida, o que dá uma pontada leve em seu ego. Depois daquele beijo, ela não deveria desmaiar aos pés dele? Mas ela está sorrindo. Quer saber se Hodge está espionando eles. Ele a tranquiliza, mas sente sua risada suave viajar através de suas mãos unidas como isso aconteceu? enquanto descem as escadas.

E ele entende. Ele entende por que as pessoas dão as mãos: ele sempre pensara que tinha a ver com possessividade, dizendo Isto é meu. Mas tem a ver com manter contato. É falar sem palavras. Significa quero você comigo e não vá.

Ele a quer em seu quarto. E não dessa forma nenhuma garota jamais esteve em seu quarto desse jeito. É seu espaço particular, seu santuário. Mas ele quer Clary lá. Quer que ela o veja, como ele é de verdade, não a imagem que ele mostra ao mundo. Ele quer se deitar na cama com ela e que ela se enrosque nele. Ele quer abraçá-la enquanto ela respira suavemente durante a noite; vê-la como ninguém mais a vê: vulnerável e adormecida. Vê-la e ser visto.

Então, quando eles chegam à porta dela, e ela agradece pelo piquenique de aniversário, ele ainda não solta a sua mão. “Você vai dormir?”

Ela levanta a cabeça e ele pode ver que sua boca carrega a marca de seus beijos: um rubor rosa, como os cravos da estufa, e isso dá um nó em seu estômago. Pelo Anjo, ele pensa, eu estou tão…

“Você não está cansado?”, pergunta ela, interrompendo seus pensamentos.

Há um vazio na boca de seu estômago, uma sensação de nervosismo. Ele quer puxá-la de volta para si, derramar sobre ela tudo o que ele está sentindo: sua admiração, seu conhecimento recém-adquirido, sua devoção, sua necessidade. “Nunca estive mais acordado.”

Ela ergue o queixo, um movimento rápido e inconsciente, e ele se inclina, segurando seu rosto com a mão livre. Ele não pretende beijá-la aqui público demais, muito fácil de ser interrompido mas ele não consegue parar de tocar sua boca na dela suavemente. Os lábios dela se abrem sob os dele, e ele se inclina para ela e não consegue parar. Eu estou tão

Foi exatamente nesse momento que Simon abriu a porta do quarto e pisou no corredor. E Clary se afasta dele rapidamente, virando a cabeça de lado, e com isso ele sente a dor aguda de uma bandagem sendo arrancada de sua pele.

Eu estou tão ferrado.

[Traduzido por Equipe IdrisBR. Dê os créditos. Não reproduza sem autorização.]

FONTE

Siga @idrisbr no Instagram e não perca as novidades
Facebook