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Resenha: Maame – Jessica George


“Maame”
Jessica George
Tradução: Karine Ribeiro
Arte de capa: Kgabo Mametja
Paralela – 2024 – 460 páginas

Romance finalista do TikTok Book Awards na categoria livro do ano. A estreia literária de Jessica George apresenta uma jornada da heroína moderna, protagonizada por Maddie: os desafios de lidar com a família, as tragédias, os perigos — e as recompensas — de se arriscar na vida e no amor.

Aos 25 anos, Maddie está esperando que sua vida comece para valer. Enquanto observa colegas que moram sozinhas, namoram e tomam os primeiros passos de suas carreiras, a maior parte do seu dia a dia é dedicada ao cuidado do pai, que sofre de doença de Parkinson. Quando finalmente tem a chance de viver novas experiências, ela se aventura e encara as alegrias e desafios de amadurecer e se encontrar.

Ler “Maame” foi uma experiência que realmente me pegou desprevenida. Já imaginava, pela sinopse, que seria um livro sobre dor e crescimento, mas não esperava que fosse também uma jornada de autodescobrimento de uma mulher preta de 25 anos, filha da país ganeses erradicados na Inglaterra, que como única filha mulher, precisou amadurecer cedo demais em uma família um tanto quanto disfuncional, mas com ligações profundas. O amor de Madeline Wright por seus pais e seu irmão é real e mesmo todos sendo falhos, são uma família unida. Falhos, como todos nós humanos temos, que torna o relacionamento conflituoso e frustrante por muitas vezes, sempre com um amor profundo.

Mas sinto que preciso explicar, antes de tudo, o que significa o apelido Maame, que dá título ao livro: em axante, uma das línguas faladas em Gana, significa mulher – e é assim que nossa protagonista é chamada desde pequena, sempre com a ideia de que precisava ser uma mulher, uma adulta mesmo se do a mais nova de sua família. Seus pais estão separados, mas ainda casados, e sua mãe passa um ano em Gana e outro na Inglaterra com a família, cuidando dos negócios que tem no país de origem. James, o irmão mais velho de Maddie, trabalha para um amigo que se tornou um músico famoso, viajando e vivendo uma vida que não se aproxima em nada da mais nova, que mora na mesma casa que o pai, que está sofrendo de Parkinson.

Minha mãe me chama de uma de três coisas: meu nome e todas as suas variações incluídas, um apelido carinhoso e Maame. Maame tem muitos significados em axante, mas no meu caso, significa mulher. Tenho sido chamada de Maame desde que me entendo por gente e amava ser referida como mulher quando ainda era uma garotinha. Amava ser vista como adulta antes mesmo de ter menstruado. Mas agora eu…

Como fica claro desde começo, com a mãe em outro país e o irmão viajando com o tal amigo famoso, Maddie ficou na casa dos pais e fez uma faculdade local, agora re resumindo a trabalhar e cuidar do pai, todos os dias, em uma rotina direta. Ao contrário de diversas amigas da época do colégio, Maddie não saiu de casa para ir estudar a faculdade, já tendo ficado no lugar para cuidar do pai, sempre indo direto para casa depois de suas aulas na faculdade. Em seu aspecto profissional, está em um trabalho que odeia, com uma chefe tóxica que joga seus erros para a assistente, culminando em uma demissão injusta.

Como se não bastassem, a mãe de Maddie está chegando de Gana e diz que ela deveria se mudar e ir viver sua viva – leia-se aqui encontrar um homem para casar, já como já conta com 25 anos. Em um movimento inesperado, Maddie realmente sai de casa, atuando um quarto na casa de Jo e ainda dividindo com uma segunda garota, Cam. Acreditando que a mãe poderia realmente cuidar do pai, Maddie vai se permitindo sair, conhecer pessoas e enfim tentar se apaixonar por um cara que conheceu, Ben, e que parece legal demais para ser verdade. Mas a vida tem um jeito estranho de acontecer, e a jornada de Maddie está só começando.

Algo está mesmo errado com você — sussurro, cortando pimentões. — Você é tão problemática. Quimicamente desequilibrada, talvez. Devia procurar isso no Google. Não pode ficar triste sem motivo; não é um estado humano natural. Na vida, você deve ser feliz ou contente, apenas experimentando momentos de tristeza, então se a tristeza é seu estado natural, o que isso diz sobre você? — Largo a faca e bato a palma da mão na minha testa. — Só para, porra.
Com certeza posso consertar meu cérebro se bater na minha cabeça com força o bastante.
Limpo meus olhos e continuo a cortar os pimentões.

O que mais me impressionou nessa leitura não foram os acontecimentos (que me pegaram de surpresa, confesso) e sim a forma como Jessica George escolheu desenvolver sua narrativa, saindo de um ponto de partida que poderia ser uma boa e velha comédia romântica repleta de humor para uma jornada profunda que ressalta a importância de se ouvir e da saúde mental. Uma Maddie que está se descobrindo, tentando encontrar seus caminhos, tentando descobrir o que quer fazer e como quer fazer enquanto assume para si mesma que é muito boa de guardar segredos e não enfrentar seus verdadeiros medos e sentimento, tudo enquanto uma das piores coisas que poderiam acontecer para alguém, acontece. A fraqueza e as falhas da nossa heroína é também uma de suas maiores qualidades.

Maddie é acompanhada por duas amigas que não moram com ela mas são fieis e a ajudam mesmo quando ela está parecendo querer afastar todas as pessoas ao seu redor – Nia e Shu, que sempre que aparecerem, puxam os holofotes para elas. As desilusões acontecem, o coração partido, as complicações de se dividir um apartamento com pessoas que não se tem tantas afinidades, tudo isso vai sendo explicitado e mostrado quando a pior dor da jovem chega, sem pressa, sem pulos e sem sobressaltos. Simplesmente a vida de uma pessoa acontecendo de uma forma cotidiana, mas repleta de significados, exatamente como a nossa vida é.

Com certeza eu já fui feliz em algum momento — digo para a água fervente. — Mas como dá pra saber? Como as pessoas sabem se estão genuinamente felizes ou só estão bem, com momentos de alegrias interrompidos por um redemoinho de tristeza? Talvez esse tempo todo eu só tenha estado bem.

Como também já mencionei, a saúde mental de Maddie começa a se deteriorar enquanto a vida vai acontecendo de uma forma contínua, junto com as decepções e a dor que ela enfrenta acumulado com anos de ignorar sentimentos e perguntas que deveriam ser feitas. A certeza de que não é merecedora de algo começa a se infiltrar a medida que vai se dando conta que viver é sempre uma momento de descoberta e, em diversos casos, de dor. Parece somente uma repetição, mas que na narrativa termina sendo muito bem colocado e desenvolvido. Não há como não ficar tocado e com um peso no coração quando a ansiedade da jovem mulher começa a se tornar mais e mais forte, até o momento que ela tem uma crise de pânico e pesquisa sobre na internet, e foi ai que tive de dar uma pausa na leitura porque estava realmente me afetando. Mas também quero pontuar que a narrativa também é permeada pelas perguntas que Maddie faz no google, além de algumas mensagens de texto que troca com suas amigas e mãe.

O relacionamento de Maddie de com a mãe é um dos pilares da trama – e também um dos grandes motivos de muito que ela passa atualmente. Abri esta resenha falando que a havia amor na família, mas enquanto a escrevia me questionei isso, me questionei muito sobre a mãe de Maddie e a forma como ela lida com as coisas, mas, no geral, cada leitor vai chegar a sua própria conclusão, exatamente como com suas experiências e vivência. Tudo isso é uma experiência pessoal e a leitura também é, assim como a dor o crescimento, então se você deseja ler sobre crescer, aprender e amar, “Maame” é o livro que te indico, sem dúvidas.

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