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Resenha: Verão de lenço vermelho – Elena Malíssova & Katerina Silvánova

Sinopse: Vinte anos depois de ter passado seu último verão no acampamento Andorinha, Iura decide voltar. Os tempos são outros: já não existe União Soviética, o muro de Berlim caiu, sua vida seguiu adiante. Então não é nenhuma surpresa que, ao chegar lá, ele só encontre ruínas. Ruínas repletas de memórias.
Memórias daquele verão usando lenço vermelho no pescoço. O verão em que participou do clube de teatro ― e até acabou gostando. Em que inventou histórias de terror para divertir as crianças mais novas. Em que passeou de barco e deitou sob a sombra do salgueiro. O verão em que conheceu Volódia, um rapaz certinho, educado e muito inteligente. O verão em que viveu seu primeiro amor.
Talvez, enterrada ali em algum lugar, exista alguma pista que o leve até Volódia. Afinal, algumas pessoas marcam nossa vida para sempre ― e, mesmo décadas depois, ainda vale a pena lutar por elas.

Passei um bom tempo encarando o documento do word, pensando em como iria escrever essa resenha de “Verão de lenço vermelho”, não por não ter gostado, mas por esse livro ter me impactado mais do que eu pensei que impactaria.

Verão de lenço vermelho” se passa em duas linhas do tempo por assim dizer. Temos a linha do tempo em que Iura se encontra atualmente, já adulto, tendo vivido uma vida inteira quando ele decide que precisa voltar até onde um dia foi o Acampamento Andorinha porque tem algo lá que ele precisa buscar de volta – uma capsula do tempo, que deixou lá em 86, no último ano em que esteve no acampamento e o ano em que a vida dele mudou completamente.


“E onde isso tinha ido parar? Será que tinha valido a pena aquela felicidade rápida e efêmera para se despedir tão dolorosamente e passar a vida inteira só com memórias?”

Todos conheciam Iura como um garoto bagunceiro. A fama dele, depois de anos no acampamento e principalmente depois do ano anterior, não era das melhores. Por isso, quando ele chegou naquele ano, tudo que acontecia já iam atrás do garoto, pensando que a culpa de tudo era dele.

E por conta disso, ele estava em risco de ser expulso do acampamento, tendo que trabalhar na parte do teatro apenas como uma punição para ele aprender a se comportar direito e, assim, se ele falhasse nesse trabalho, seria mandado para casa com a desonra de ter sido expulso.


“Ao reavivar aquelas lembranças, sentia outra vez algo pungente, quente e familiar. Mas, ao mesmo tempo, sentia certo amargor: tudo ali se tornara estranho e desconhecido.”

Não é nenhum exagero dizer que Iura preferia a morte a trabalhar no teatro: não só por ser um teatro e ele não ter papel nenhum na peça, tendo que ficar como assistente do diretor, como pelo fato de que desde que botou os olhos em Volódia, Iura simplesmente decidiu que não suportava o outro que era certinho demais para estar perto dele.

Claro que com o tempo as coisas foram mudando: Iura passou a gostar de estar no teatro não só por se divertir ali, mas principalmente por causa de Volódia, que foi se aproximando cada vez mais dele, criando um laço forte de amizade entre os dois garotos. Volódia era monitor do acampamento, mas era apenas dois anos mais velho do que Iura e estava ali por apenas um motivo: queria uma boa recomendação para entrar no partido da URSS, porque queria ser um diplomata da URSS nos Estados Unidos, enquanto Iura não tinha sequer ideia do que fazer da própria vida, porque a única coisa que ele gostava de fazer – tocar piano – estava em um capítulo encerrado de sua vida.


“Iurka estremeceu: em que mundo ele vivia? Era tão injusto, errado e idiota assim? Porque era o mundo que estava enganado, não Iurka.”

No verão de 1986, as coisas ainda eram muito complicadas na região da URSS (não que agora não seja, mas enfim, era pior), então se interessar por um garoto de uma forma romântica não era algo considerado “normal”, era considerado uma coisa monstruosa e nojenta e absurda, então quando Iura sentiu que estava gostando de Volódia como mais do que um amigo, ele não sabia o que fazer, mas sabia que precisava fazer algo.

Não demorou muito para ele acabar “se declarando” para o amigo e, Volódia, que também não entendia fazer com o que sentia, achava que estava sendo uma péssima pessoa e influenciando Iura de uma maneira errada. Então eles passaram o verão “juntos” da forma como conseguiam e combinaram que iriam se corresponder e se visitar – apenas quando Iura entrasse na faculdade de música. Mas claro que a vida nem sempre segue como a gente imagina e muitas coisas acontecem que afastam os dois garotos – o que nos leva ao momento presente, onde Iura se encontra tentando achar algo que era precioso pra ele – e encontrar junto com isso qualquer sinal que possa ter de Volódia e o que o outro ainda lembra dele e do verão que passaram juntos e, principalmente, do que sentiam um pelo outro.


“Nunca tinha parado para pensar que, quando você aperta a mão de alguém, é como se a segurasse por alguns instantes. Mas pensou dessa vez. E entendeu, de repente, que queria ficar segurando a mão de Volódia por mais tempo.”

O livro cobre bons anos da vida de Iura. Não detalhadamente, mas a parte mais importante sim: podemos ver o quanto ele evolui e amadurece do garoto irresponsável do começo do livro para um homem que tem uma vida séria agora e que sabe o que quer fazer e como quer fazer. Ao contrário de Volódia, que tudo que nós temos é o passado que eles tiveram juntos e algumas cartas que foram trocadas antes de perderem o contato um com o outro.
A história toda é muito boa em demonstrar encontros e desencontros de duas pessoas que nunca se superaram, mas também que nos anos 80, achavam que não poderiam ter um futuro juntos – era errado, era ruim. Eles sabiam que o que sentiam um pelo outro não era ruim, mas sabiam que o mundo inteiro pensava ao contrário deles e, várias vezes, Volódia falava sobre como: “não é possível que todo mundo esteja errado e a gente esteja certo”.


“Ele tinha passado a entender por que os adultos voltavam ao acampamento como monitores, por que cantavam com tanta sinceridade “Noites azuis” e usavam o lenço e o barrete com tanto orgulho. Não era exatamente para voltar à infância, mas para ficar um pouco mais perto dela.”

Isso era uma coisa que me pegava muito durante a leitura e provavelmente foi por isso que esse livro me impactou tanto. A forma dura como Volódia dura com ele mesmo e com os próprios sentimentos, como toda uma geração via – e ainda vê – algo tão bonito, o amor entre duas pessoas, como algo tão ruim e incorreto. O que me deixa mais triste é saber que apesar de muita coisa ter melhorado de lá para cá, muita coisa ainda precisa melhorar e bem mais.

A história escrita por Elena e Katerina é completa, cheia de idas e vindas entre o passado e o presente, nunca falhando em deixar a gente completamente vidrado em cada página, em cada detalhe, em cada pequena coisa que se passa, querendo saber mais e mais. E agora, mais do que nunca, eu estou bem feliz de saber que esse livro maravilhoso terá uma continuação.

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