06.12


“Oito horas perfeitas”
Lia Louis
Tradução: Lígia Azevedo
Arte de capa: Nik Neves
Paralela – 2022 – 304 páginas

Qualquer coisa poderia ter acontecido naquele dia. Mas Noelle nunca imaginou que uma nevasca fecharia a estrada e ela passaria a noite parada no trânsito, sozinha, sem comida, água ou um carregador de celular. E sequer pensou que, de repente, estaria sentada no carro do charmoso Sam, um norte-americano em uma breve visita à Inglaterra, tendo a melhor conversa de sua vida ― por oito horas perfeitas. Mas Sam está a caminho do aeroporto e ambos sabem que, no dia seguinte, seus caminhos se separarão para sempre. Mas e se o destino reservar um plano diferente para eles?

Essa resenha será curta, prometo. Vou falar pouco e vou direto ao ponto: “Oito horas perfeitas” é perfeito no que se propõe. Sem brincadeiras. Mas cuidado que o livro te engana em alguns pontos e vou te explicar nesta resenha o que quero dizer com isto. Logo no começo, temos aquela lenda chinesa do fio vermelho que ligam duas pessoas que estão destinadas: algumas vezes a linha pode emaranhar, mas nunca se partir. E ninguém no mundo pode dizer que em algum ponto da sua vida não ficou com o coração cheio de esperança de algo assim ser real. E ah, preciso ainda aclamar a capa de Nik Neves que é uma original e é uma das capas mais lindas que já tive o prazer de pegar em mãos – essa foto nem faz jus a capa, tô falando sério. As cores, a textura da capa, tudo nessa capa ficou perfeito.

Muitos que acompanham o site sabem que não gosto de livro de romance só sendo romance, mas aqui temos um livro com um romance (porque sim, o quase-não-acontece romance entre Noelle e Sam é o que conduz o livro) de vida real que consegue colocar empecilhos no caminho do casal principal sem tratar o leitor como burro, sem colocar vilões maquiavélicos (além da vida normal) e que deixa seu coração quentinho com o bom e velho destino como um dos motores desta história. E sim, há pinceladas de saúde mental neste livro, o que faz a combinação ser nada menos do que perfeita no que se propõe.

Não tenho certeza de como imaginei que estaria neste momento na vida. Se quinze anos atrás me perguntassem “Então, Noelle, como você acha que vai estar no dia nove de março daqui a quinze anos?”, eu provavelmente teria dito algo como “Feliz e resolvida” ou “Parecendo ter saído de um catálogo de Natal. Sentada num daqueles sofás de canto sofisticados, numa bela casa, com um marido sorridente vestindo suéter”. Uma coisa é certa: eu não esperava isso. Estar sozinha, presa no carro, no meio da neve em uma estrada parada, com o celular morto e as lágrimas removendo a maquiagem mais rápido do que qualquer demaquilante caro seria capaz. E com o coração partido, pelo menos um pouco. Resumindo, nada no controle. E “nada no controle” não estava entre as muitas coisas que eu poderia ter esperado. Nem de longe.

Quando conhecemos Noelle, a personagem está vindo da sua antiga escola, onde enterraram capsulas do tempo que deveriam ser abertas 15 anos depois – o que nos traz ao tempo atual. Ela quer demais a capsula que enterrou com sua melhor amiga, Daisy, que morreu pouco tempo depois do evento, em uma noite que saiu com o garoto dos seus sonhos. Na capsula, há uma maquina descartavel com fotos tiradas naquela noite entre as duas jovens, então é mais do que natural o desejo de reavê-la e ver as fotos ainda inéditas. Noelle ainda está sofrendo pelo término de um relacionamento de 12 anos com Ed, que também estudava com ela e Daisy e que também tem fotos com Noelle na câmera. Ed, um bem-sucedido médico, partiu para os Estados Unidos, terminando o relacionamento porque acreditava que sua agora ex-namorada priorizava todas as pessoas menos ela própria e que precisava amadurecer.

Voltando a ordem cronológica da narrativa, saindo do evento, Noelle fica presa em um grande congestionamento dentro do seu carro antigo – e sem bateria no celular, só tendo tempo de avisar a mãe onde estava. Surpreendentemente, um homem alto e bonito bate na janela do seu carro, lhe oferecendo uma carga de celular, deixando que escolhesse se iria acompanhá-lo ou não. Imprudentemente, Noelle vai com o homem (já que a alternativa também não era lá muito fácil, afinal, deixar o celular com um desconhecido, mesmo que presos no meio de uma estrada) mas, para sua surpresa, o homem, que se chama Sam, é nada menos do que a pessoa com quem mais consegue conversar de forma fácil. Parecendo ter sido o destino a fazer aquele encontro acontecer, os dois ficam horas juntos presos naquele congestionamento, entendendo que os dois estavam tendo horas perfeitas. Mas, quando a estrada enfim é liberada, Sam segue em seu carro sem pedir o contato da mulher, que fica decepcionada. Mas vida que segue, certo? Não tanto.

É incrível quão rápido uma hora e meia passa quando se está tendo uma conversa assim — do tipo inesperadamente natural e que faz com que você se sinta como se as palavras não saíssem da boca rápido o bastante. Do tipo em que minutos logo se tornam horas, ao mesmo tempo que parecem fazer o mundo fora da sua bolha congelar. Um meteoro poderia cair, e você nem desviaria os olhos e perguntaria: Sentiu isso? Um tremorzinho?

A verdade é que a vida de Noelle não está seguindo normalmente e em parte parou para que ela cuidasse de sua mãe, convalescente de um AVC e claramente está lutando contra os efeitos psicológicos do que enfrentou, já como uma doença graça assim não atinge somente seu corpo e deixa sim, sequelas em quem você é e traz o famigerado medo. Parte de Noelle se ressente porque a mãe claramente trata diferente o irmão dela, Dilly, que está tentando seguir a carreira de músico e não ajudando nas despesas da casa, deixando toda responsabilidade nas costas da irmã. Tendo certo sucesso nas redes sociais fazendo buquês e arranjos florais, Noelle sente que poderia seguir essa carreira, mas precisa trabalhar fazendo faxinas para conseguir juntar dinheiro e ajudar a custear o tratamento da mãe e, claro, as contas da casa.

Mas, de alguma forma, Sam e Noelle se encontram semanas depois mais uma vez. Sam tem um pai que mora na mesma cidade que Noelle e está no hospital, mesmo lugar onde a mãe dela vai parar. Neste encontro, ela toma a frente e dá seu telefone para Sam – e depois descobre que ele jogou o papel fora. Os dias passam, Noelle continua trabalhando com o marido de sua amiga Charlie, dando de cara com seu ex-namorado Ed que voltou para a cidade. Vida seguindo, ela é levada a fazer uma faxina por vários dias para um senhor de idade que está se mudando e, mais uma vez, dá de cara com Sam. Todos os caminhos parecem querer levar Noelle e Sam a se encontrarem, mesmo ele tendo um relacionamento e ela tentando resolver o seu. Mesmo com ele morando em outro país. Mesmo com os dois tendo aquela sensação de não terem coragem de se jogar em algo novo e tentarem resolver algo que não mais parece funcionar. E este é o grande trunfo de “Oito horas perfeitas”: ser tão crível assim. Você entende os personagens, você entende o medo que Noelle tem, você entende o medo que Sam tem, você entende o medo que Charlie tem, você tende o medo que mãe de Noelle tem, você entende que muito da vida nos causa medo e só nos resta continuar tentando e lutando.

Então ouço uma voz crítica e direta na minha mente, como uma atriz depois de ouvir sua deixa: O que você tá fazendo? Acha que isso é uma brincadeira ou um conto de fadas? Não é um filme, Noelle, é a vida real. A sua vida. Isso não vai levar a lugar nenhum. De jeito nenhum, de forma alguma. Porque Sam vai pegar um avião e voltar à vida dele, e você vai dirigir até em casa e voltar à sua. Levison Drive, sua mãe, sua rotina, seu trabalho, e ponto final. Porque vocês dois nem se conhecem. Você não o conhece, e ele não conhece você. Balanço a cabeça na escuridão do carro, como uma criança repreendida, puxando o cobertor pesado até o queixo.

Por mais que o livro seja sim, uma história de romance com pitadas do destino interferindo, ainda há mais na trama, como mencionei no começo: saúde mental é pincelada com a mãe de Noelle e o medo que tem depois do AVC que sofreu, além da própria Noelle também lidar com sua saúde mental (ainda mais depois da morte prematura de Daisy) e Sam também teve episódios de crise de pânico quando mais jovem depois de ter sofrido uma perda. Uma coisa que me enganou bastante no livro foi que parecia ser um livro natalino – e não, a trama começa em março e pode até ter passagens pelo natal e neve, mas não espere uma comédia romântica que se passa, desenvolve e resolve durante o natal. E, acima de tudo, temos o destino, que funciona como um dos fios condutores da história de Noelle e Sam. O tempo inteiro eles quase entendem o papel que devem ter um na vida do outro, mas, assim como uma pessoa teimosa muitas vezes em sua vida nega o que está diante de si, eles relutam.

Então sim, se você quer um romance fofo, que te faz acreditar no destino e em pessoas destinadas a estarem juntas, com personagens principais que precisam acreditar em quem são e confiarem no destino, “Oito horas perfeitas” é o livro certo pra você – e tenha em mente que é um livro realmente fofo, romântico e que te deixa com o coração bem cheio de amor ao terminar. O tipo de livro que te faz realmente desejar que o fio vermelha exista e seja capaz de te dar bem mais do que só oito horas perfeitas e sim, uma vida inteira. Leia sem medo.

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