“Para sempre interrompido”
Taylor Jenkins Reid
Paralela – 2021 – 304 páginas
Tradução: Alexandre Boide
Elsie e Ben pareciam ter todo o tempo do mundo: vinte e poucos anos, recém-casados, apaixonados. Entre eles as coisas sempre aconteceram depressa, como uma explosão irrefreável de energia. Elsie só não tinha como saber que o brilho de seu romance seria tão fugaz.
Pouco mais de uma semana depois de se casar, Elsie perde Ben em um acidente e sente o futuro se desfazer diante de seus olhos. Só o que resta é um eterno agora, carregado de questões não resolvidas do passado.
Para atravessar sua dor, Elsie precisará inevitavelmente olhar para trás. Não só para entender a dimensão de sua perda, mas também para conhecer a nova família que nunca chegou a ter ― e para descobrir, enfim, quem ela se tornou depois de ter seu final feliz interrompido.
Hoje é o dia da publicação do último livro da Talor Jenkins Reid ainda inédito no Brasil e eu não poderia não trazer uma resenha de “Para sempre interrompido” para vocês, então ok, vamos lá: fazem mais de 6 dias que terminei de ler “Para sempre interrompido” e não sei se vou ser capaz de colocar no papel tudo que eu quero e senti enquanto lia o livro. Acho o mais justo começar falando e explicando que eu comecei lendo Taylor Jenkins Reid de trás para frente em uma ordem completamente fora da cronologia: a ordem de publicação dos seus livros é “Para sempre interrompido”, “Depois do Sim”, “Em outra vida, Talvez?”, “Amor(es) Verdadeiro(s)”, “Os sete maridos de Evelyn Hugo”, o conto publicado somente em formato eBook na Amazon “Evidence of the Affair”, “Daisy Jones and The Six” e “Malibu Renasce”. Eu comecei lendo justamente por “Os sete maridos de Evelyn Hugo”, pulando para “Daisy Jones and The Six” e depois voltando para “Depois do Sim”. E isso foi um erro.
Foi um erro porque, como todo autor, a escrita da Taylor desenvolveu e evoluiu durante os anos. Ler “Os sete maridos de Evelyn Hugo” e “Daisy Jones and The Six” para depois ler “Depois do Sim” foi trapaça da minha parte porque esperei demais do livro, que foi o segundo da carreira da Taylor. Estou contando isso para ilustrar meu “relacionamento” com “Para sempre interrompido”: seria o livro da Taylor que eu iria ler, mas estava controlando as expectativas porque sabia que era o 1º livro escrito por ela. Pareceu correto na minha cabeça tentar conter as expectativas pelo que tinha acontecido antes, afinal, a Taylor de 2013, ano original da publicação deste livro, obviamente não é a mesma Taylor de 2021 que escreveu “Malibu Renasce”. Peguei o livro e fui ler tentando dizer para mim mesma deixar a mente aberta, não esperar demais e aproveitar, apesar de ser um tema que eu claramente me identifico, o luto. E bem, agora que terminei, não sei se foi sábio da minha parte deixar as expectativas tão baixas porque a Taylor conseguiu algo com esse livro que eu particularmente nunca tinha visto em um livro sobre perdas: uma narrativa real, chegando até mesmo a ser cruel, mas, ainda assim, doce. Mesmo nos piores momentos da jornada de Elsie, você sente uma sensação de que está lendo algo que foi escrito com delicadeza, não para amenizar o que é realmente sofrer quando se perde alguém que se ama, mas sim porque há também amor nessa história, o que nos leva a ter certeza que o luto está diretamente proporcional a quantidade de amor investida. E eu amei este livro. Ainda doí lembrar e falar sobre, porque ele é um ciclo completo do luto, com negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. E passar por tudo isso doí.
Não senti nada de diferente ao entrar na pizzaria. Nenhuma parte do meu cérebro ou do meu corpo sabia o que estava por vir. Não tive nenhuma premonição. Estava usando um par de galochas de um amarelo bem vivo e uma calça jeans bem larga. A chuva colou meu cabelo no rosto, e eu já tinha desistido de tentar desgrudá-lo da pele.
Nem percebi Ben ali sentado. estava envolvida demais no processo de tentar comprar uma pizza. Quando a moça do caixa me avisou que ainda demoraria dez minutos, fui me sentar no pequeno banco na frente da pizzaria, e então me dei conta de que havia outra pessoa na mesma situação que eu.
Meu coração não acelerou nem nada do tipo. Eu não fazia ideia de que aquele seria “o” momento; que aquele cara era “ele”. O homem com quem eu sonhava desde criança, quando me perguntava como meu marido seria. eu estava olhando para o rosto que passara a vida inteira imaginando, mas não o reconheci. Só o que fiz foi pensar: A pizza dele deve sair antes da minha.
Sem nunca ter sido muito apegada a sua família, Eleanor – ou melhor, Elsie, como gosta de ser chamada, sempre encontrou todo conforto e amor em sua melhor amiga, já como seus pais, renomados médicos, não conseguiam entender que sua filha não era uma extensão deles e tinha seus próprios sonhos e desejos. Já na faculdade, ela entende que nunca iria alcançar as expectativas dos pais e muda seu curso para biblioteconomia, e quando Ana decide se mudar para Los Angeles para perseguir a carreira de atriz, a decisão chega bastante fácil, fazendo com que a dupla saia da costa leste do país para se mudar para a costa oeste, colocando bastante distância entre seus pais. Ana, que é brasileira (!!!), é o oposto dela: enquanto a amiga sempre consegue qualquer homem que deseja, parecendo ser muito intensa, Elsie é calma, tranquila e gosta de ser assim. Vivendo para o trabalho, tendo o apartamento que decora do jeito que deseja, passeios com Ana (elas não moram juntas porque Elsie sabe que jamais daria certo) e algumas festas, a vida está boa e tranquila.
Até que no dia 1º de janeiro, depois de uma grande festa de virada de ano, Elsie vai até uma pizzaria próxima do seu apartamento pegar uma pizza para comer, já como a entrega demoraria muito. E assim, em uma noite chuvosa, sem qualquer perspectiva de grandes acontecimentos, Elsie conhece um cara que também estava esperando sua pizza. A química é instantânea e o leitor é apresentado ao melhor mocinho que poderia esperar: Ben é calmo, tranquilo, um leitor ávido e que se apaixona por Elsie na mesma intensidade que ela se apaixona por ele. Contatos são trocados e pronto, o casal está formado com essa intensidade toda, com essa química toda, com essa paixão toda.
Acordo sempre no mesmo mundo feio e repulsivo, e todas as vezes volto a fechar os olhos com força assim que lembro quem eu sou. Quando finalmente me levanto da cama, por volta da hora do almoço, não é porque estou pronta para encarar o dia, e sim porque não aguento mais encarar a noite.
Mas calma que eu comecei falando da trama do livro em ordem cronologia e não é assim que acontece na narrativa: de cara, nas primeiras páginas, vemos Elsie e Ben recém-casados no mês de maio, em uma conversa corriqueira no sofá do apartamento dela (no qual vão morar) e ela decide que quer comer um tipo específico de sucrilho que nem é popular no Brasil, e Ben, sendo o doce que é, decide que vai comprar para a esposa. Ele pega a bicicleta, se despede com um beijo e sai do apartamento. E é isso. Ele nunca mais volta.
Depois de uma espera que considera excessiva e ligações para o celular do marido, Elsie escuta barulho de sirenes e desce desesperada, vendo a cena que ela (e o leitor) não queriam ver: a bicicleta retorcida de Ben embaixo das rodas de um caminhão, com sucrilhos pelo chão. A reação de Elsie é a mesma de qualquer pessoa que acaba de se ver em uma situação dessas: ela não entende, não acredite e se desespera, tudo ao mesmo tempo. Elsie escuta a noticia que ninguém está preparado para ouvir e o leitor sofre com a personagem. Realmente sofre. Nada parece fazer sentido, nada faz sentido – e é assim que ela é levada por um policial ao hospital, que a pergunta se deveria ligar para alguém. A resposta é óbvia: Ana. Mas, para sua surpresa, uma mulher entra no lugar chorando, claramente afetada pela mesma morte que está destruindo Elsie: sua sogra, Susan, a qual nem ao menos foi apresentada oficialmente.
Não tenho a menor ideia do que fazer agora. Não consigo pensar além desta tarde. Não sei como vou sobreviver aos próximos minutos, muito menos às próximas horas. E não existe ninguém capaz de tornar esses minutos mais fáceis. Por mais que ana tente, por mais que mantenha minha casa limpa, por mais que seja gentil comigo. Não faz diferença se eu tomar um banho, se sair correndo pela rua pelada, se beber cada gota de álcool desta casa, Ben não vai voltar para mim. Ele nunca mais vai voltar para mim. De repente sinto que posso não ser capaz de viver mais este dia e, se ana não estiver aqui para me vigiar, não sei o que posso fazer.
Porque sim, elas não foram apresentadas: Ben e Elsie se conheceram no 1º dia do ano, passaram 5 semanas em um romance intenso, decidiram morar juntos e em maio eles casaram praticamente fugidos, somente os 2, e pouco mais de uma semana depois, Ben morre. E o leitor fica confuso porque entende que Ben e Elsie estavam fugindo do típico romance clássico, mas Ben, que sempre pareceu (e disse ser) bastante apegado a mãe, estava escondendo o romance dela – então o que estava acontecendo aqui? Por que ele iria esconder algo assim, uma parte tão grande de sua vida? A resposta vem na narrativa e é mais mundana do que esperávamos: não há uma trama de suspense ou uma tentativa de enganar Susan ou Elsie. Há somente a vida. E é a vida que continua guiando o que vai acontecer as personagens.
Continuamos divididos entre ler e entender como todo relacionamento perfeito de Elsie e Ben aconteceu (e também entendemos o que estava acontecendo com Susan e o que ela já estava passando em sua vida) com a colisão forte que é o primeiro encontro das duas mulheres em luto: Elsie está arrasada, basicamente em choque de saber que perdeu o amor de sua vida, enquanto Susan está com raiva de descobrir que o filho escondeu uma esposa pela qual estava profundamente apaixonado. Claro que isso não termina bem, e claro que Elsie toma as atitudes que tomou: a falta de energia e força está mais presente em sua vida do que a raiva.
“Será que enlouquecemos?”, perguntei. “Sinto que você é diferente de todo mundo que já conheci, e não consegui pensar em outra coisa o dia todo. eu… a gente mal se conhece, e eu estava com saudade. isso é loucura, não? eu nem te conheço. Meu medo, eu acho, é que o que existe entre nós seja tão intenso que acabe não durando, sabe? uma espécie de romance concentrado, se é que isso existe.”
“Tipo uma supernova?”
“Como assim?”
“É uma explosão estelar tão poderosa que é capaz de emitir a mesma quantidade de energia que o sol em toda sua existência, só que isso acontece em, sei lá, dois meses, e aí a estrela morre.”
Susan é uma personagem que é muito, muito forte e vai sendo construída a medida que a narrativa vai sendo apresentada. Não espere gostar dela em sua primeira aparição porque ela está desesperada, em choque, nervosa com a morte do filho único. Não espere gostar dela na sua segunda aparição quando está tomada pela dor, raiva e ressentimento por entender que o filho estava escondendo Elsie dela e decide que quer as coisas do seu jeito, mesmo Elsie falando que não deveriam ser assim. Não espere gostar dela nem em sua terceira aparição, quando ela enfim entende que foi grosseira com a nora que não conhecia e reaparece pedindo desculpas. O gostar pela Susan é construído em grande parte do livro, a medida que o luto de Elsie vai crescendo e a forma como ela começa a lidar com tudo que sente.
Elsie, na contramão, está lutando para simplesmente manter a cabeça fora da água e conseguir respirar. A dor da personagem está lá, latejando, pulsando, lembrando que ela tem uma ferida aberta que não pode ser simplesmente ignorada. Elsie vai se tornando amarga, má, grosseira, todas as coisas que quem sofre usa para transforma sua dor e colocar para fora. Eu sei que quem convive com alguém que está passando por essa dor tamanha não tem obrigação de aguentar esse tipo de coisa, mas, infelizmente, algumas dores precisam ser sentidas, e são sentimentos venenosos, capazes de destruírem relacionamentos. Ver a personagem entender que está sendo mesquinha até mesmo com sua melhor amiga é difícil de ler, realmente difícil, mas faz sentido dentro do que ela está passando. Não estou dando carta branca para quem sofre fazer o que quiser e ser maldoso da forma como quiser, mas estou afirmando que uma pessoa pode ser maldosa e ruim em um momento aonde dói, dói tudo, dói muito, e depois entender o quão horrível estava sendo.
“E depois acho que vou me mudar para aí mesmo, daqui a uns quatro anos. Depois de um ano e meio podemos ficar noivos, e esperar mais um ano e meio para casar. acho que vou querer um tempo só para nós dois antes de ter filhos, tudo bem? Então talvez o primeiro bebê venha aos trinta. O segundo aos trinta e três ou trinta e quatro. Por mim tudo bem ter três, desde que o dinheiro seja suficiente para levar uma vida confortável. Então, levando em conta o seu relógio biológico, vamos tentar o terceiro antes dos trinta e oito. Já vai ter todo mundo ido embora para a faculdade quando a gente tiver cinquenta e cinco. Seremos só nós dois de novo, e aí a gente se aposenta aos sessenta e cinco e sai para uma viagem ao redor do mundo. Tipo, hoje a vida começa aos sessenta, e não mais aos quarenta, né? Ainda vamos ser saudáveis e cheios de energia. Podemos voltar da viagem pelo mundo lá pelos setenta, e ainda vamos ter uns dez ou vinte anos para passar com os netos. Você pode fazer jardinagem, e eu vou começar a fazer esculturas ou alguma coisa assim. e aí aos noventa a gente morre. Que tal?”
Eu dei risada. “Você não levou em conta a sua crise de meia-idade aos quarenta e cinco, quando vai sair de casa, me largar sozinha com as crianças e começar a namorar uma professora de jardim de infância com peitões enormes e uma bunda durinha.”
“Não”, ele falou. “Isso não vai rolar.”
“Ah, não?”, desafiei.
“Não. eu encontrei a pessoa certa para mim. os caras que fazem isso estão em outra situação.”
Além de Elsie, Ana e Susan, temos outro personagem que ajuda diretamente na condução da narração: trabalhando como bibliotecária, Elsie conhece um velhinho chamado George Callahan, que termina conhecendo Ben e fazendo parte de muitas passagens na vida de Elsie, tentando ajudar da forma com seus quase noventa anos de idade. A medida que os meses vão passando, a dor da personagem vai se modificando, transformando-se em outros sentimentos tão intensos quanto, e muitas escolhas são feitas, até mesmo as mais estúpidas – eu também iria rir se fosse você, Sr. Callahan (quando você ler, você vai entender). Acho que foi uma das coisas que mais gostei no livro foi a forma como os meses se passam e, de certa forma, tudo muda e tudo continua exatamente estático, no mesmo lugar, com Elsie tentando sobreviver aquele caos que se instalou em seu peito.
Em duas passagens eu tive MUITO medo que a narrativa fossem pelo caminho “mais fácil” e menos doloroso, mas, para minha surpresa, mesmo sendo seu primeiro livro, Taylor mostrou porque ela é tão boa em seus livros: algumas vezes o menos difícil não acontece (e isso está presente em seus livros) e, assim como os personagens, nós, na vida real, somos obrigados a lidar com aquelas situações. Elsie passa por toda dor e todo processo de luto como falei no começo desta resenha, e leva o leitor com ela, mostrando que há sim, doçura e amor em momentos difíceis, em situações desertas, no desespero: por que se ela não tivesse amando tanto Ben, ela não estaria sofrendo tanto. O luto, a raiva, o desespero, tudo isso faz parte da jornada dela e de quem a acompanha, de um jeito que marca e no leitor. E sim, eu, que tanto falo que não gosto de chorar em diversas resenhas, confesso que chorei aqui mais de uma vez – e uma delas foi com a Susan no velório do filho. E, no final, você vai sentir que seguiu uma jornada que teve o final que era o que podemos esperar da vida de quem sobrevive, de um jeito agridoce e honesto.
E acho que agora entendi que, quando você perde o que mais ama no mundo, nunca mais volta a ficar tudo bem.
“Para sempre interrompido” se tornou um dos meus livros favoritos da Taylor, e uma altura dessas eu nem sei qual é meu favorito mais, sinceramente. Pensei em dizer que era “Os sete maridos de Evelyn Hugo”, mas me lembro da dor que “Para sempre interrompido” me causou, e acho que é ele. Eu sei que o enredo do livro pode parecer, a primeira vista, não ser o tema favorito de quem me lê, mas nem todos livros são sobre amores que duram a vida inteira ou o tipo de final feliz que esperamos, assim como a vida não é. E justamente por não podemos escolher o final que vamos ter, que precisamos pensar que sim, alguns “para sempre” são interrompidos. E nós vamos sobreviver. Mesmo que nunca mais sejamos iguais.
Vocês podem ler outras resenhas, um post com tudo sobre as adaptações da Taylor Jenkins Reid que fizemos e mais vindo na tag da autora aqui no site clicando AQUI.
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