29.11

Sinopse: Há anos, Sloane, Ardie e Gracie trabalham juntas em uma empresa de roupas esportivas. As três sempre se ajudaram, passando por promoções empolgantes, reuniões intermináveis, casamento, maternidade, divórcio e os desafios impostos pela política no escritório. Elas também têm seus segredos e cada uma fez algo de que se arrepende.

Com a morte repentina do presidente da empresa, tudo indica que Ames, o chefe delas, será alçado à liderança da companhia. Ames é um homem complicado, que as três conhecem há muito tempo e que sempre esteve cercado por sussurros a respeito do tratamento que dispensa às subordinadas. Esses sussurros vinham sendo ignorados, varridos para debaixo do tapete e acobertados por aqueles que estão no poder.

Depois de descobrirem que Ames adotou uma conduta inaceitável em relação a uma nova funcionária, elas decidem falar. E essa decisão provoca uma mudança catastrófica no escritório. Mentiras serão reveladas. Segredos serão expostos. E nem todo mundo sobreviverá. Suas vidas — como mulheres, colegas, mães, esposas, amigas e até adversárias — estão prestes a mudar drasticamente.

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“Nosso legado seriam nossas palavras. Gritadas bem alto. Para todos ouvirem. Estávamos fartas de implorar que acreditassem em nós. Não pediríamos mais o benefício da dúvida. Não pediríamos mais permissão. A palavra era nossa.”

Eu sei que já falei aqui algumas vezes antes em outras resenhas minhas sobre livros girlpower que, quando eu era mais nova, eu tinha um pouco de medo de ser associada a palavra “feminista”. Por tanto tempo essa palavra foi usada de uma forma tão ruim que parecia péssimo você querer ser uma. Claro que eu sempre torci para mais heroínas do que para heróis, eu sempre quis ver mais coisas diferentes do que um cara enorme salvando o mundo. Eu queria ver garotas como eu. Mas, mais nova e sem tanta experiencia, eu não queria muito ser vista como feminista ou falar dessas minhas vontades.

Me bastava ser “uma dos caras”, ser amigona deles e tudo mais, não retrucar e aceitar quieta mesmo que fizessem algo que eu não achava tão legal assim, simplesmente pra não ser tachada como “nossa, ela só tá falando isso porque é menina”. E eu sei que muitas mulheres, moças também passaram por isso. Muitas ainda passam por isso. Graças a Deus os anos passam e a gente acumula experiências e aprende que: não tem nada, absolutamente nada, errado em sermos mulheres e nos impormos como mulheres e falarmos o que queremos e o que pensamos sobre essas coisas. Se eu pudesse voltar no tempo para dar um recado pra quem eu era com 15 anos, quando passei por algumas coisas que eu passei, eu diria: não fique quieta. Isso não vai fazer bem pra ninguém, mas principalmente não vai fazer bem pra você.

O que eu queria mesmo era que tivessem mais livros como “Rede de Sussurros” quando eu era uma adolescente e precisava aprender as coisas e entender elas. E, por isso, chega de falar de mim e vamos falar desse livro maravilhoso.

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“Eles ouvem um “não” e pensam que é uma ótima oportunidade de ser “persistente”, “implacável” ou qualquer outra palavra da moda no mundo corporativo que acabaram de aprender no último TED Talk que viram no YouTube. É com esses caras que a gente tem que tomar cuidado. Muito conservadores. Estabelecidos.”

O livro começa com uma morte. Naquele início, sem ter lido a sinopse (eu faço muito isso pra não deixar de me surpreender com o que vem pela frente), não é dito o nome de quem morreu ou o que. Só que uma pessoa se jogou do alto do prédio onde trabalham as nossas três personagens principais: Ardie, Grace e Sloane. Assim como o aparente suicidio aconteceu, começa uma investigação. E então o livro volta em exatos 20 dias antes dessa morte para mostrar tudo que foi levando até o ponto que culminou aquela tragédia: e tudo aquilo também começou com uma morte.

O presidente da empresa onde elas trabalham na área jurídica morreu e com isso a vaga está prestes a ser preenchida por Ames, um homem com um histórico meio questionável em relação as moças da companhia e com quem duas delas tem uma pequena “história”: Sloane, muitos anos atrás teve um caso com Ames, pouco depois de entrar na empresa e desde então o homem usa esse caso deles, assim como o fato de ela ser uma mulher, para diminuir qualquer coisa que ela fale: tudo se resume a “para de ser dramática”, “isso é por conta de tpm?” e aquele monte de outros tipos de frases no mesmo tipo que nós mulheres já ouvimos boa parte da vida.

E Ardie, que não suporta nem estar no mesmo ambiente que ele – e a recíproca é mais do que verdadeira. Eles simplesmente se odeiam, sem um motivo aparente, e então evitam de tudo para conviver. Junto com as duas, temos Grace, que acabou de ter um neném, que não tem nenhum histórico junto a Ames – e isso a leva a fazer algumas escolhas que me deixavam, às vezes, com vontade de dar uma pequena sacudida nela.

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“Porque Sloane estava verbalizando algo em que todas nós acreditávamos, que era o fato de que sabíamos a diferença. Como sabíamos quando um comportamento era inapropriado? A gente simplesmente sabia. Qualquer mulher com mais de quatorze anos provavelmente sabia. Acredite ou não, não queríamos ser insultadas. Não ficávamos sentadas, torcendo os dedos, esperando que alguém aparecesse e nos insultasse para que tivéssemos o que fazer naquele dia. Na verdade, usávamos dezenas de desculpas para evitar a fadiga. Dávamos o benefício da dúvida. Encarávamos o comentário de um homem sobre como nossos saltos destacavam nossas panturrilhas como algo bem-intencionado. Entendíamos o desejo de que traçássemos um limite claro — isso pode, isso não pode. Essa linha não existia, ou pelo menos não de forma que pudéssemos traçar. Mas acredite que, quando começávamos a trabalhar, nossos medidores já tinham sido testados dezenas de vezes. Éramos especialistas em nosso campo.”

Logo que a história começa, nesses 20 dias anteriores a morte que ocorreu na empresa, Ames simplesmente contrata uma moça chamada Katherine para que ela trabalhasse com Sloane, mas quando ele passa muito mais tempo com a moça do que ela, alarmes começam a apitar na cabeça de Sloane, a fazendo comentar coisas que aconteceram entre ela e o homem e que ela tenta a todo custo não se lembrar. Nesse mesmo passo, uma lista chamada “CILADA” começa a circular por várias empresas da região, onde é criada uma rede de sussurros: ali as mulheres anotam nomes de homens com quem trabalham e o que eles fazem de errado com as mulheres, para alertar outras e fazer com que evitem eles.

Nisso, ocorre a Sloane e a Ardie que talvez seja uma boa ideia elas acrescentarem o nome de Ames ali, relatando a própria experiência de Sloane, numa tentativa de fazer com que Katherine se afaste dele antes que o pior aconteça.

Enquanto a história vai se desenrolando, também somos apresentadas a outra personagem que acaba sendo fundamental em todo desenvolvimento do plot: Rosalita. Ela trabalha na limpeza da empresa e ela e Ardie têm um relacionamento muito próximo, visto que Ardie ajuda o filho de Rosalita a estudar para conseguir a bolsa em um colégio muito prestigiado, simplesmente porque ela gosta de Rosalita.

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“— (…) Porque — continuou ela, já que ninguém ofereceu uma sugestão — parece que o plano de ação de vocês teria sido que ela, o quê, ficasse calada? Deixasse que o Steve a tocasse? Deixasse que um menino a empurrasse, a apalpasse, enfiasse a mão no short dela porque ele acha isso engraçado, porque ninguém faria nada para impedir, porque ele estava a fim? Sem revidar? Será que entendi mais ou menos o enredo?
(…)
Estamos apenas tentando explicar que a violência nunca é a solução — garantiu o diretor Clark.
Ah, bem, bom saber. Mas se a violência for contra meninas é mais como uma, o quê? Uma área cinzenta? De modo geral, tudo bem? Tudo ótimo, contanto que a gente leve na esportiva? Ao que me parece o senhor está confundindo quem foi violento e quem agiu em legítima defesa.

Eu não quero explorar muitos detalhes da história, porque acredite em mim, é muito melhor você ler assim como eu li: sem saber o que esperar e para onde ia tudo aquilo e todas essas pessoas que estão envolvidas nessa história. O livro, como já diz o nome, foi inspirado pelo movimento “#MeToo” que tomou conta das manchetes nos Estados Unidos, quando um grupo de mulheres decidiu que bastava: elas não aceitariam mais serem assediadas sexualmente em seus ambientes de trabalho (e em nenhum lugar).

Cada uma das três personagens principais tem seu ponto de vista no livro, assim como Rosalita também tem: Ardie é uma das personagens mais inteligentes que eu já vi nos últimos tempos. Ela tem uma clareza invejável na hora de pensar em momentos de crise e ao mesmo tempo ela é a mais misteriosa das três, pra mim. Várias coisas sobre ela nós sabemos apenas no exato momento em que ela quer que a gente saiba, porque nem ao menos as duas mulheres que ela mais confia ali sabem.

Já Sloane é muito mais passional e impulsiva. Em vários pontos eu colocava minha mão na testa e dava uma apertada, porque eu imaginava que não podia resultar nada de bom no jeito que ela tinha lidado com certas situações, simplesmente porque ela adorava trocar os pés pelas mãos e me deixar nervosa. Mas Sloane é… Eu nem sei explicar em palavras. De verdade. Ao mesmo tempo que ela me deixava querendo arrancar os cabelos, eu ficava querendo bater palmas pra ela, porque ela é simplesmente maravilhosa (e maravilhosa ainda é muito pouco pra descrever ela).

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“Era impossível precisar quando aquele temor instintivo e imediato por nossa segurança tinha se instalado, a necessidade de olhar para trás ao atravessar um estacionamento vazio, de verificar embaixo do carro, de se inquietar quando um homem estranho se aproximava pelas nossas costas, de nos assustar quando ele nos parava para perguntar as horas. A percepção de que esse medo era particular a nós veio depois, a percepção de que, diferentemente dos meninos com quem brincávamos em ruas sem saída quando éramos pequenas, jamais superaríamos as historinhas da infância que serviam de lição. Sempre haveria estranhos nos oferecendo doces.”

Então temos Grace que, com perdão do trocadilho, é uma graça. Grace era a “garota perfeita com o casamento perfeito e a bebê perfeita”, mas basta um momento do ponto de vista dela pra você ver que as coisas não são bem assim. Grace tem muito acontecendo dentro dela, não posso explanar aqui pra não entrar em detalhes e acabar com o desenvolvimento dela que ocorre durante o livro mesmo com as coisas pelas quais ela está passando.

Rosalita também não fica pra trás: apesar de não ser uma “das principais”, ela tem uma história bem interessante e bem complexa e é um ponto muito, MUITO importante mesmo em uma grande parte da história – mas isso fica para vocês lerem e decidirem o que pensam sobre isso, só saibam que eu achei absurdamente magnífico (apesar de ter descoberto antes disso ter sido “desvendado”).

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“Fracassar era um luxo que não podíamos nos permitir, acorrentadas umas às outras daquele jeito, nosso destino trancado à chave. Um fracasso de bilheteria de uma diretora e ninguém mais queria filmes de “menina”; uma queda vertiginosa no mercado de ações de uma empresa com uma presidente, e mulheres não sabiam liderar; uma acusação falsa e éramos mentirosas, todas. Porque quando nós falhávamos, era por causa dos nossos cromossomos, e não por causa de uma crise no mercado, uma campanha publicitária ineficaz ou simples má sorte.”

O tempo todo a história gira em torno do mistério sobre o que aconteceu na empresa naquele dia em que a cada capítulo nós temos transcrições e conversas de depoimentos: tanto das três mulheres principais quanto de outras pessoas da empresa e pessoas que viram quando o corpo caiu. Em cada um desses pedaços em que eles mostravam partes de conversas e comentários que falavam sobre o ocorrido e ficavam contra as moças, eu sentia meu sangue borbulhando de ódio.

Eu passei, na verdade, por muito ódio e amor pelo livro enquanto eu lia, porque eu imaginava que ia acontecer o que aconteceu em determinada parte e isso me deu raiva, mas ao mesmo tempo eu amei a direção em que o livro tomou e achei que tinha que ter sido bem assim.

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“Éramos sempre as exageradas, as histéricas, palavra literalmente derivada do latim “hystericus”, ou “do útero”. Na verdade, uma grande quantidade de tempo e de palavras tinha sido dedicada à arte do descrédito. Adjetivos como “mandona”, “briguenta”, “nervosa” e “intensa” se tornaram desculpas sutis destinadas a ajudar a justificar a perda de audição seletiva.”

Agora o final, amigues… Eu não sei nem como descrever pra vocês. O fechamento todo é absurdamente estupendo. E o epílogo deste livro me deixou tão arrepiada que me deu vontade de transcrever ele todinho aqui pra vocês, mas não farei isso porque é algo que vale ser lido na íntegra, junto com toda essa história maravilhosa.

Esse é mais um daqueles livros que eu encaixo na faixa de: MUITO NECESSÁRIO. Ele É necessário, porque são assuntos que têm que ser falados assim como ele é ali: de forma crua e direta e não colocando panos quentes em cima. Já passou da hora dessa pauta deixar de ser um tabu e de nós termos que ouvir quietas e aguentar quietas coisas que nos fazem mal, só levando na esportiva.
Se você, como eu, gosta de livros com personagens femininas fortes e também gosta daquele girl power que todas nós precisamos em algum ponto na vida: “Rede de Sussurros” é o livro pra você. Leia, tenho certeza que não vai se arrepender.

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“O que iríamos perceber, pelo visto tarde demais, era que quando um prédio está em chamas, ninguém sussurra “Fogo”. Ninguém fica sentado em silêncio diante da mesa, concluindo diligentemente o trabalho e corrigindo erros de digitação enquanto a fumaça entra na sala. Ninguém pede “socorro” com delicadeza, em voz baixa, para não perturbar os colegas.
Então, por que fazíamos isso?”

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