15.11

“O Instituto”
Stephen King
Suma – 2019 – 544 páginas

No meio da noite, em uma casa no subúrbio de Minneapolis, um grupo de invasores assassina os pais de Luke e sequestra silenciosamente o menino de doze anos. A operação leva menos de dois minutos.

Quando Luke acorda, ele está no Instituto, em um quarto que parece muito o dele, exceto pelo fato de que não tem janela. E do lado de fora tem outras portas, e atrás delas, outras crianças com talentos especiais, que chegaram àquele lugar do mesmo jeito que Luke. O grupo formado por ele, Kalisha, Nick, George, Iris e o caçula, Avery Dixon, de apenas dez anos, está na Parte da Frente. Outros jovens, Luke descobre, foram levados para a Parte de Trás e nunca mais vistos.

Nessa instituição sinistra, a equipe se dedica impiedosamente a extrair dessas crianças toda a força de seus poderes paranormais. Não existem escrúpulos. Conforme cada nova vítima vai desaparecendo para a Parte de Trás, Luke fica mais e mais desesperado para escapar e procurar ajuda. Mas até hoje ninguém nunca conseguiu fugir do Instituto.

Em mais um livro com sua assinatura, Stephen King agora coloca como personagem principal um garoto de 12 anos que se une a um grupo de amigos para tentar fugir do tal Instituto – aqui os monstros são outros. Essa fórmula já consagrou o autor há muitos e muitos anos atrás (do grupo de amigos, que fique claro!), tanto no conto “O Outono da Inocência” quanto no livro “It – A Coisa”. Você pode se questionar se repetir essa mistura não ficou uma leitura já ultrapassada e vencida, mas, lembre-se, estamos falando de Stephen King, por isso a sua resposta é um sonoro e retumbante: Não. Simples assim.

Mas o livro curiosamente não começa por com Lucas “Luke” Ellis e sim pelo errante Jamieson, um ex-policial cansado de toda violência e corrupção que testemunhara em seu antigo emprego. Viajando, ele chega a pequena e isolada cidade de DuPray em basicamente uma jornada sem rumo e depois de diversas ocorrências que só se pode creditar ao destino. Na pequena cidade, Jamieson decide aceitar um emprego de vigia noturno e ficar por lá somente um tempo, sem a menor intenção de fincar suas raízes na cidade, mas, novamente, o destino vai agir e vai colocar Luke em seu caminho, por mais que o cansado homem ainda não saiba.

— Você sabe o que dizem sobre o abismo, não sabe? — perguntou Herb.
Luke balançou a cabeça, ou porque era uma das raras coisas que ele não sabia, ou porque não queria estragar a frase de efeito do pai.
— Quando você olha pra ele, ele olha pra você.

Confesso que fiquei bastante confusa com o começo do livro, justamente por ter lido a sinopse e saber que Luke seria o personagem principal, mas, em toda introdução do livro (que não foi rápida, deixo claro), nada do personagem aparecer. E esse é um dos maiores traços de King: ele se prende em passagens que terminam trazendo bastante informação sobre o que Jim quer, mas você se pergunta: “Tá, mas aonde está o Luke mesmo?”. Calma que vai fazer sentido porque é claro que as histórias dos dois personagens irá se encontrar bem mais adiante no livro.

Enfim Luke entra na história, mostrando que ele é tão inteligente aos seus doze anos de idade que planeja fazer duas faculdades ao mesmo tempo, apoiado pelo diretor da já escola para crianças superdotadas que estuda. A inteligencia do garoto pode, a princípio, ser equiparada a uma arrogância que não permite ao leitor se identificar com Luke, até acontecer o sequestro que está assinalado na sinopse do livro: e é ai que o calvário do personagem começa. Acordando em um quarto que ele tem certeza que é uma réplica do seu, Luke logo encontra os outros garotos tão inteligentes quanto ele que estão naquele lugar, que agora ele sabe se chamar “Instituto”. Lá as pessoas parecem entender as pequenas coisas que aconteciam com Luke que ele nunca realmente pensou sobre: quando fica com raiva ou nervoso, coisas se movem ao redor dele, e que lá dentro existem duas categorias: os TC e TP – os primeiros são os que possuem telecinesia, e os segundos, telepatia. Todos os seus novos amigos também possuem essas habilidades, fazendo com que ele entenda que não está mesmo ali ao acaso, por mais que queiram que ele acredite que só está ali para ser estudado. Luke não acredita, e nem o leitor.

— Primeiro, eles nos marcam como se fôssemos aves migratórias ou malditos búfalos. — Nicky empurrou o cabelo para trás e dobrou o lóbulo da orelha para a frente, mostrando um círculo de metal brilhante do tamanho de metade de uma moeda de dez centavos. — Eles nos examinam, nos testam, nos dão as picadas por pontos, que são as injeções para ver pontos, nos examinam de novo e fazem mais testes.

E é ai que o terror começa, mas me permita explicar e deixar claro que o terror aqui não é como em “It – A Coisa” ou até como em “O Cemitério”. O terror que permeia as paredes do Instituto é o humano: uma organização governamental que sequestra crianças (qualquer semelhança com os tempos atuais não é mera coincidência, estamos falando de Stephen King, ele tem essa coragem) e as usa para o que afirma ser “um propósito maior” é de aterrorizar, até porque King não se poupa nas cenas de torturas psicológicas e físicas que essas crianças passam, chegando até mesmo se tornar desconfortável em alguns pontos, mas aqui eu afirmo que ele não passou do ponto em momento nenhum.

Pelo corredor do lugar, a amizade entre Luke, Kalisha, Nick, George e Iris começa a realmente florescer enquanto eles explicam ao recém-chegado que eles estão na “parte da frente” do lugar, e quem vai “para a parte de trás” normalmente nunca mais é visto – eles querem acreditar que volta para suas famílias, mas Luke sabe e nem quer acreditar nisso mais, ciente de que sua vida como ele conhecia acabou na noite que ele foi sequestrado. O esmero para fazer o leitor se apegar aos protagonistas juvenis é recompensado: você se importa com eles e sofre com o que vai acontecendo dentro daquele lugar, odiando todos que tem a capacidade de machucar aquelas crianças. Tudo termina se tornando mais e mais intenso com a chegada de Avery Dixon, o mais novo entre eles, com apenas 10 anos. Avery se apega a Luke, em uma figura de irmão mais velho, e você sente medo pelos personagens e pelo que pode acontecer com eles.

— Não estamos nos Estados Unidos, estamos no Reino do Instituto. Quando você for ao refeitório almoçar, Ellis, olhe pelas janelas. Você vai ver muitas outras árvores, mas, se olhar bem, também vai ver outro prédio. É de concreto verde, igual a este. Se mistura com as árvores, eu acho. Lá fica a Parte de Trás. É pra onde somos encaminhados depois que os testes e as injeções acabam.
— O que acontece lá?
Foi Kalisha quem respondeu.
— Não sabemos.

O fundo politico e as críticas sociais na narrativa são intensas e você não pode ignorá-las, além de fazer com que você sinta que esse livro também faça parte do “Kingverso”, já como o autor gosta de mencionar pequenos easter eggs de seus livros uns nos outros, e aqui não é diferente (“Salem”, estou olhando para você!). Tudo isso torna a jornada de Luke bastante intensa e gratificante de se ler e você entende porque o livro é dedicado aos netos do autor, com as figuras pequenas passando por situações que realmente não deveriam, nas mãos de sociopatas que trabalham naquele lugar que existe com um propósito completamente vulgar. Claro que os garotos encontram um jeito de tentar acabar aquilo, resultando na fuga de Luke, enquanto você, leitor, fica torcendo pelo garotinho conseguir sair de lá e, de preferência, matar todos que o trataram daquele jeito – não se iluda, é um livro de Stephen King, mortes são naturais e eu já tinha perdido a empatia por todos que trabalhavam no lugar há muitas páginas atrás.

Em sua fuga, os destinos de Luke e de Jim vão se trombar, assim como diversos outros personagens menores da cidade de DuPray, palco de um grande confronto, assim como em diversas pequenas cidades dos livros de King. Evito dar qualquer spoiler, mas “O Instituto” estão muito mais cravado na realidade e em momentos de desenvolvimento de personagens do que em momentos de desespero voltados para o terror, mesmo quando todo confronto que está sendo construindo acontece, caminhando para um final que, sinceramente, eu não esperava. A leitura, nesse ponto, já está daquele jeito: você não consegue parar porque quer saber o que vai acontecer com aqueles personagens.

— Sabe, Jamieson, essa vida que achamos que levamos não é real. Não passa de uma brincadeira de sombras e eu vou ficar bem feliz quando as luzes se apagarem. No escuro, todas as sombras desaparecem.

Normalmente sempre vejo a pergunta “Por onde começar a ler Stephen King?”, já como o autor tem mais títulos do que conseguimos acompanhar (apesar de tentar sim!), e aqui fica a sugestão: comece por “O Instituto”. O terror aqui não é na categoria propriamente dita e muito mais psicológica (apesar de, como falei acima, existem sim, cenas de tortura física que são difíceis de ler, mas algo dentro dos limites suportáveis), e, assim como “A Incendiária” (já resenhei o livro e você pode ler clicando AQUI), a explicação aqui não é sobre aliens, forças ocultas do mal (tirando os próprios humanos) e muito menos uma luta contra um mal intangível, se tornando uma leitura bem mais indicada para se iniciar o mundo do autor, que tem a fama de não saber encerrar suas obras, mas que aqui termina com todas as pontas amarradinhas e com um final bastante satisfatório.

A edição da Suma é o que todos já conhecem e sabe: excelente. Não encontrei erros e as páginas são amareladas, de fácil leitura e apesar do livro ser grande, meu livro não ficou marcado em nenhuma página que li. E mais uma última informação: uma minissérie já está em andamento, já como os direitos do livro foram comprados antes mesmo de sua publicação.

Para comprar “O Instituto”, basta clicar no nome da livraria:

Amazon, por R$ 55,86.
Saraiva, por R$ 62,91 com o cupom LIVROS10OFF.
Submarino, por R$ 55,91.
Cultura, por R$ 55,86.
Travessa, por R$ 69,90.
Martins Fontes, por R$ 69,90.

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