BlogLivros

Resenha: Comer, rezar, amar – Elizabeth Gilbert


“Comer, rezar, amar: A busca de uma mulher por todas as coisas da vida”
Elizabeth Gilbert
Tradução: Fernanda Abreu
Arte de Capa: Joana Figueiredo
Objetiva – 2025 – 360 páginas

“E se sua vida pertencesse a você?” Foi essa a pergunta que Elizabeth Gilbert se fez ao virar a própria vida de cabeça para baixo, partindo sozinha em uma viagem de autodescoberta. Seu objetivo era visitar três lugares onde pudesse explorar diferentes aspectos de sua natureza. Em Roma, estudou a arte do prazer, aprendeu italiano e engordou os onze quilos mais felizes de sua vida.

Na Índia, se dedicou à arte da devoção e, com a ajuda de uma guru local e de um caubói texano surpreendentemente sábio, embarcou em quatro meses de contínua exploração espiritual.

Em Bali, estudou a arte do equilíbrio entre o prazer mundano e a transcendência divina. Tornou-se discípula de um velho xamã, e também se apaixonou ― por um brasileiro ― da melhor maneira possível: inesperadamente.

Ninguém precisa se divorciar ou se mudar para a Índia para transformar a vida ― “Não faça o que eu fiz; pergunte-se o que eu me perguntei”, recomenda Gilbert. Só assim você poderá encontrar, como ela encontrou, uma real sensação de liberdade e alegria com a própria existência. Comer, rezar, amar é um convite irrecusável a todos que queiram se abrir à inesgotável, e às vezes necessária, vontade de mudar.

Elizabeth Gilbert tem tudo que se pode esperar de uma mulher de 31 anos: casada e escritora e com uma carreira estável, ela não deveria estar no chão do banheiro do seu quarto chorando e se questionando sobre a vontade de continuar naquela casa recém comprada com seu marido depois de anos de namoro e muito menos agradecer quando menstrua, mesmo depois de estar supostamente tentando engravidar. Elizabeth não deveria sentir nada disso, mas sente e sente tanto a ponto de enfim fazer o que seu coração pede, deixando o marido e o relacionamento mais do que estável.

Logo se vê em outro relacionamento com um ator que está interpretando uma personagem escrita por ela em uma peça, mas este relacionamento é tóxico no sentido de que ela e David não funcionam juntos. Tudo isso vai acontecendo enquanto continua trabalhando, o divórcio se tornando insuportável porque seu ex-marido, ferido, não quer abrir mão de nenhum dos bens conquistados pelo casal. A beira de um colapso emocional com o fim do novo relacionamento, os ataques de 11 de setembro a cidade na qual morava e todo desgaste emocional, Elizabeth decide fechar o apartamento que alugou em New York e viajar. E é assim que a jornada de nossa protagonista começa em um livro que é uma crônica de como uma mulher que deveria se sentir feliz mas na realidade se sentia miserável ganhou o mundo a ponto de ganhar uma (muito bem) sucedida adaptação cinematográfica com Julia Roberts no papel principal.

Certa vez, a re­vis­ta The New Yorker pu­bli­cou uma ti­ra. Duas mu­lhe­res estão con­ver­san­do e uma de­las diz para a outra: “Se você qui­ser mesmo co­nhe­cer al­guém, precisa se di­vor­ciar dessa pes­soa.” Minha ex­pe­riên­cia, é cla­ro, era o opos­to. Eu di­ria que, se você qui­ser mesmo deixar de co­nhe­cer al­guém, precisa se di­vor­ciar dessa pes­soa. Porque foi isso que acon­te­ceu entre mim e meu ma­ri­do. Acho que nós dois fi­ca­mos cho­ca­dos com a ve­lo­ci­da­de com a qual dei­xa­mos de ser as duas pessoas que melhor se co­nhe­ciam no mun­do para nos trans­for­mar­mos na du­pla de des­co­nhe­ci­dos que me­nos se en­ten­dia de todos os tempos. No fundo dessa es­tra­nhe­za ha­via o fa­to de­so­la­dor de am­bos es­tar­mos fazendo al­go que a outra pes­soa ja­mais te­ria con­si­de­ra­do pos­sí­vel; ele ja­mais so­nhou que eu de fa­to o dei­xa­ria, e eu nun­ca, nem em meus de­va­neios mais lou­cos, pen­sei que ele tor­na­ria a mi­nha saí­da tão difícil.

Decidida a viajar por um ano, Liz divide suas “férias” ou “ano sabático” ou como você quiser chegar em 3 fases: 4 meses na Itália, 4 meses na Índia e 4 meses na Indonésia. A primeira parada dela, os 4 meses na Itália, é motivada pela vontade da mulher de aprender Italiano, língua que ela considera a mais bonita (e é, concordo) do mundo e que a leva a sair de um lugar de palidez na alma para começar a receber novas cores, refletindo em seu corpo. Vinda deste processo de divórcio devastados de alguém que acreditava conhecer para completos estranhos e um novo relacionamento que só lhe fez mal, a dor de Liz se refletia em seu corpo com uma magreza excessiva. É na Itália que ela volta a começar a querer brilhar por ela mesma, aceitando o fim de seu péssimo relacionamento e aprendendo a “comer” do titulo do livro.

Essa também é a minha parte favorita do livro porque é como se um peso começasse a sair de Liz. Tenho bastante dificuldade de me relacionar com a protagonista porque requer bastante coragem (mas bastante mesmo) para largar a vida assim e simplesmente ir viajar – tá, ela estava financeiramente assegurada, já como vendeu os direitos do livro antecipadamente e foi com este dinheiro que ela pagou as contas e suas viagens neste ano, mas, ainda assim, parece ser muito para minha cabecinha de alguém bem cheia dos prazos e que gosta de viver assim. O passado de Liz também é mais apresentado nesta fase, fazendo o leitor saber mais sobre os pais e sobre a vida dela, os irmãos e principalmente sobre Catherine, a irmã mais velha (e minha personagem favorita, sendo sincera). É aqui que Liz começa a se abrir para si mesma, apresentando mais do que ela realmente precisa: se perdoar. O que leva a sua segunda viagem.

instruções para a liberdade
1. As me­tá­fo­ras da vi­da são as ins­tru­ções de Deus.
2. Você aca­ba de su­bir até o to­po do te­lha­do. Não há na­da entre você e o Infinito. Agora, li­ber­te-se.
3. O dia está ter­mi­nan­do. É ho­ra de al­gu­ma coi­sa que foi bo­ni­ta se trans­for­mar em outra coi­sa que também seja bo­ni­ta. Agora, li­ber­te-se.
4. O seu de­se­jo de re­so­lu­ção foi uma pre­ce. O fa­to de você es­tar aqui é a res­pos­ta de Deus. Liberte-se e veja as es­tre­las sur­gi­rem – do lado de fo­ra e do lado de dentro.
5. Com todo seu co­ra­ção, peça a gra­ça e li­ber­te-se.
6. Com todo seu co­ra­ção, per­doe-o, PERDOE A SI MESMA e li­ber­te-o.
7. Permita que sua in­ten­ção seja a li­ber­da­de do so­fri­men­to inú­til. Então, li­ber­te-se.
8. Veja o ca­lor do dia se trans­for­mar em noi­te fres­ca. Liberte-se.
9. Quando o car­ma de um re­la­cio­na­men­to ter­mi­na, res­ta ape­nas o amor. É se­gu­ro. Liberte-se.
10. Quando o pas­sa­do fi­nal­men­te ti­ver saí­do de você, li­ber­te-se. Depois des­ça e co­me­ce o res­to da sua vi­da. Com gran­de alegria.

Um ponto sobre Liz é a sua fé. Lembram-se quando comentei sobre ela esta no chão do banheiro chorando? Ela também estava rezando. Praticante de ioga, Liz decide ir para a Índia, mas, ao mesmo tempo que a Itália a abriu para a ideia de se perdoar e começar a se reerguer, ela se afastou da ioga e não meditou em nenhum dos dias que esteve lá. Mas a jornada da mulher ainda está no meio e aposto que vocês podem imaginar que haverá cenas aqui que levam o leitor à beira das lágrimas de tão comoventes. Há algo que este livro me ensinou à esta altura da narrativa: é lindo ler personagens se apaixonando, mas também é lindo ver personagens aprendendo a se amararem e se perdoarem, encontrando pontos de equilíbrio sobre si.

E logo chegamos a parte final do livro: a viagem a Indonésia. Levada a querer conhecer melhor um xamã, Liz decidiu voltar à Bali depois de o conhecer brevemente em uma das viagens que fez a trabalho durante o seu duro divórcio. Procurando o homem até o encontrar, toma um choque de realidade ao entender que ele não a reconhece, mesmo tendo acertado tudo sobre ela no breve encontro anterior – mas talvez o velho senhor não deva ser exatamente a pessoa que ela precisa conhecer no lugar. Claro que muito mais está acontecendo e ela termina conhecendo Felipe, um brasileiro radicado no país de um divórcio bastante ruim. Reticente a principio, o romance parece começar a florescer enquanto Liz aprende que nem todas pessoas são completamente boas ou ruins, encontrando amizade e felicidade em momentos simples do dia a dia.

Ambos ri­mos. Mas então eu lhe mos­trei mi­nha he­si­ta­ção. Minha he­si­ta­ção era a se­guin­te: que, por mais que eu gos­tas­se de ter meu corpo e meu co­ra­ção me­xi­dos e re­me­xi­dos durante algum tem­po pe­las mãos de um bom aman­te es­tran­gei­ro, al­gu­ma outra coi­sa den­tro de mim ha­via fei­to um pe­di­do sé­rio para que eu de­di­cas­se aque­le ano in­tei­ri­nho à via­gem e a mim mesma. Que al­gu­ma trans­for­ma­ção vi­tal es­ta­va ocor­ren­do na mi­nha vi­da, e que essa trans­for­ma­ção precisa de tem­po e de es­pa­ço para ter­mi­nar de ocor­rer sem per­tur­ba­ção. Que, ba­si­ca­men­te, sou um bolo re­cém-saí­do do for­no, que ainda precisa de mais tem­po para es­friar an­tes de po­der ser con­fei­ta­do. Não que­ro me pri­var desse tem­po pre­cio­so. Não que­ro per­der o con­tro­le da mi­nha vi­da novamente.
É cla­ro que Felipe fa­lou que en­ten­dia, e que eu de­ve­ria fazer o que fosse melhor para mim, e que ele es­pe­ra­va que eu fosse per­doá-lo só por ter fei­to a per­gun­ta. (“Ela pre­ci­sa­va ser fei­ta, mi­nha que­ri­da lin­da, mais ce­do ou mais tar­de.”) Garantiu-me que, o que quer que eu de­ci­dis­se, ainda assim man­te­ría­mos nossa ami­za­de, já que todo aque­le tem­po que pas­sá­va­mos juntos pa­re­cia fazer tão bem a nós dois.

O grande trunfo de “Comer, Rezar e Amar”, para mim, sempre foi a forma como Elizabeth escreve sobre si mesma e a forma como ela aprendeu a se respeitar e a se perdoar, tornando-se amiga de Liz que precisa porque há um grande problema quando nós somos os problema (oi, Taylor Swift). Este livro é realmente uma grande crônica sobre sua viagem e o que aprendeu em sua jornada do fundo do poço, de uma depressão tratada com remédios, até a pura e simples felicidade. O problema é quando o livro termina. Como fica claro, este é uma história real romanceada, é claro, mas é real: foi assim que Liz conheceu Felipe e é assim que passamos a torcer pelo grande “final feliz” da autora. E talvez isso não exista na vida real, não é mesmo?

Essa edição é nova e ainda conta com um prefácio na qual Liz fala sobre a experiência de reler o livro e como já tinha esquecido o lugar ruim no qual estava quando aceitou se ouvir e começar a viajar durante aquele lado, dando mais profundidade a uma história que já a tem. Composto por 108 capitulo (109 se você contar a explicação do motivo pelo qual é dividido em 108), o livro tem toda uma vibe incrível, jogando pro leitor a sensação de estar procurando uma resposta profunda para momentos difíceis na vida. Deixando de lado todas as informações que sei da vida pessoal da autora e dos seus dois livros que “continuam” a sua vida, o que posso falar, com toda certeza, é que esse livro sempre me pegou pela ideia que vende: devemos procurar nos ouvir, mesmo quando temos medo, mesmo quando estamos confortáveis onde estamos, mesmo quando pareça loucura jogar tudo para o alto e “fugir” seja a resposta. Não posso dizer que essa formula funcionaria para todas as pessoas, mas posso dizer que este livro é realmente delicioso de ler e se inspirar.

Para comprar “Comer, rezar, amar”, basta clicar no nome da loja:

Amazon.
Magalu.