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Resenha: Depois do trovão – Micheliny Verunschk

Sinopse: Durante os séculos XVII e XVIII, a Coroa portuguesa financiou expedições pelo interior do Nordeste do Brasil com o objetivo de extinguir os povos da região, num longo conflito que ficou conhecido como “Guerra dos Bárbaros”. Bandeirantes paulistas lideraram várias dessas tropas, devastando as comunidades por onde passavam.
Essas disputas são o pano fundo de Depois do trovão , romance de Micheliny Verunschk que tem como protagonista Auati, filho de uma indígena com um frei jesuíta. Levado ainda jovem pelo próprio pai em uma dessas missões, ele é forçado a participar da destruição em série e a se reinventar como Joaquim Sertão. O que fazer quando ele próprio é vítima e perpetrador de tamanha atrocidade? Em que medida a guerra consegue embrutecer uma pessoa e esconder quem realmente se é?
Com um trabalho primoroso de linguagem ― que recorre a elementos do português castiço, da língua mirandesa, do tupi-guarani, do nheengatu paulista e das línguas tapuias ―, Micheliny Verunschk segue a tradição de autores como Guimarães Rosa e Maria Valéria Rezende e ilumina as contradições e a humanidade do sertão, em um trabalho que dialoga diretamente com O som do rugido da onça e Caminhando com os mortos .

Que Micheliny Verunschk é uma autora extraordinária todos nós que já lemos sabíamos disso. Mas o trabalho que ela teve em “Depois do trovão” é ainda mais extraordinário e maravilhoso do que já visto nas outras duas obras dela (que eu resenhei e você pode ler AQUI).

Em “Depois do trovão” nós temos um livro que aborda a “Guerra dos Bárbaros” que aconteceu nos séculos XVII e XVIII, seguindo a história de uma pessoa que presenciou e também participou dessa guerra: Joaquim do Sertão. O livro quase todo é escrito em primeira pessoa pelo próprio Joaquim e, quando eu digo que o trabalho dela foi ainda mais maravilhoso aqui, é exatamente porque eu imagino o tamanho de pesquisa que ela fez para acrescentar dialetos do português castiço, do vocabulário tupi-guarani, do nheengatu paulista e ainda mais, além de mitos antigos.

“Mas que, por arruinados que estivessem, e sempre estavam, foram esses os pés que levaram a mim ao meu destino e que foram mui tenazes e amigos ao mo trazerem até aqui.”

Enquanto nos dois livros anteriores eu sabia que sentiria muita tristeza, principalmente em “Caminhando com os mortos”, eu não sabia exatamente como iria me sentir com esse novo livro, mas principalmente eu não tinha ideia que esse livro evocaria em mim uma raiva e uma tristeza ainda maiores.

Toda a história de Joaquim, ele diz que foi dado a ele três nomes: Auati, Joaquim e um terceiro nome que não é revelado até um pouco além do meio do livro e foi esse nome que serviu pra minha tristeza pela história dele ser ainda maior por tudo que ele passou naquele meio em uma idade tão nova, vendo os horrores que viu a vida inteira.

“Despois ia ele, derramando uma lagriminha por vez, para as suas rezas, desculpando os tão grandes pecados de todos, encomendando os mortos, garantindo um quinhão no reino de Deus aos homens de nosso terço, os quais morriam longe de suas camas e cheios de arrependimentos.”

Juro que foi uma virada de plot que me pegou desprevenida, que eu não imaginei acontecendo de forma nenhuma – e quando aconteceu, partiu meu coração em um milhão de pedacinhos diferentes e é justamente por essa virada de plot que não tem muito que eu possa falar sobre a história em si muito de Joaquim, não sem dar spoilers do que acontece.

Claro que toda a guerra em si é algo triste, tanto pelo que acontecia, mas pelo fato de que Joaquim em certo ponto não parece mais se incomodar com o tanto de mortes e corpos que passam por ele, com tantas pessoas que foram destruídas por aquela guerra.

“Mas, no sertão, cada um tinha a lei conforme seu próprio entendimento e vontade. E o julgamento do Estrondoso era o que era.”

Não canso de afirmar o quanto Micheliny é extraordinária, inteligente e, mais ainda, consegue nos fisgar do início ao fim nas histórias que ela se propõe a contar. Se você não leu ainda nenhuma obra dela e não sabe por onde começar, comece por essa. Eu garanto que a história de Joaquim da Serra vai adentrar seu coração – e não sair mais da sua mente.

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